A promoção da leitura consiste na realização de atividades que induzam o contacto com livros e outros recursos escritos, com o objetivo de estimular a curiosidade e o desejo de ler, ampliar as habilidades leitoras e abrir as portas para o mundo alternativo que os textos oferecem. A promoção da leitura pode ser dirigida a qualquer grupo de idades, pois é benéfica em todas as etapas da vida. Junto das crianças torna-se crucial, pois a facilidade na compreensão dos textos exige bastante mais do que a aprendizagem formal. Na verdade, as crianças só conseguirão alcançar o domínio da leitura se a praticarem com frequência. E para que a prática de leitura se torne natural é necessário que sejam carinhosamente incentivadas a procurar livros e a lê-los, tanto nas salas de aula, como na biblioteca escolar, em família, nos tempos livres e ao longo de vários anos.
1. A promoção da leitura
Junto das crianças é muito vantajoso que a promoção da leitura comece muito antes da aprendizagem formal, podendo realizar-se a partir dos 4/6 meses, quando a criança já consegue observar ilustrações e interagir com um adulto que lhe vá chamando a atenção para cada página e identificando oralmente os pormenores e as situações. A prática de comunicar com livros de permeio deve prosseguir com frequência regular até à iniciação da aprendizagem formal e, logo que se torne evidente que a criança compreende as frases e histórias das páginas, deve incluir-se leitura em voz alta, sempre associada a conversas acerca dos diferentes assuntos e a atividades lúdicas que ampliem o prazer do contacto com os livros. Estas práticas de promoção da leitura são muito relevantes no desenvolvimento da literacia emergente tanto em família, como em contexto de creche ou jardim de infância.
No primeiro ano de escolaridade, a aprendizagem formal da leitura suscita um esforço considerável da parte das crianças, nem sempre isento de dificuldades, o que pode reduzir o seu interesse pelos livros ou até gerar desmotivação e rejeição. Torna-se por isso indispensável, que a par do tempo dedicado às atividades de aprendizagem se reservem momentos para a leitura em voz alta feita pelo professor e para outras atividades destinadas a manter ou ampliar o interesse pelo conteúdo dos livros, demonstrando assim que vale a pena o esforço de aprendizagem, pois em breve poderão ler autonomamente as obras que tanto lhes agradam. E logo que consigam começar a ler sozinhas obras com frases simples e pouco texto, é muito vantajoso que o façam, recebendo encorajamento e apoio da parte dos adultos.
Para que todas as crianças tenham oportunidade de ampliar progressivamente o número, a extensão e a complexidade das obras que vão conseguindo ler, a promoção da leitura não pode ser remetida para o tempo livre, ou para casa. O treino da leitura com obras motivantes deve manter-se uma constante nas salas de aula do primeiro ciclo e prosseguir de várias formas ao longo todo o percurso escolar. Esse é também o papel das bibliotecas escolares que devem dispor de um acervo adequado ao público leitor e criar dinâmicas que proporcionem experiências positivas com livros, envolvendo alunos e professores na escolha do que melhor se adeque aos diferentes níveis e à diversidade de interesses e, se possível, contactos com autores.
2. A importância da promoção da leitura para a aprendizagem da leitura e da escrita
O sucesso na aprendizagem inicial da leitura e o desenvolvimento de competências que permitem aos seres humanos adquirirem um bom nível de literacia estão diretamente relacionados com a frequência das práticas de leitura, desde a primeira infância e ao longo de todo o percurso educativo.
Para além do uso de manuais destinados à aprendizagem, estão comprovadas as vantagens de que os docentes proporcionem às crianças o contacto frequente com um diversificado número de livros de literatura para a infância, cuja linguagem esteja ao seu alcance e cujo conteúdo lhes possa interessar. A linguagem deve permitir a compreensão do texto, devendo o número de palavras que não fazem parte do léxico mental do leitor ser reduzido, para permitir uma fluência que assegure compreensão.
A multiplicação de contactos com livros que suscitem prazer de ler (e de observar) gera motivação para a leitura e um efetivo envolvimento do leitor. Muito diferente é a atitude de quem lê apenas por obrigação, pois não chega a estabelecer uma ligação afetiva ao conteúdo da obra. O envolvimento do leitor pode ocorrer com obras informativas, caso o leitor sinta curiosidade e os textos lha satisfaçam. No entanto, entre as crianças é mais frequente acontecer com obras de ficção.
É possível detetar algumas características intrínsecas dos textos que contribuem para desencadear envolvimento na leitura e classificá-los em três gradações: textos que não afastam o leitor; textos que satisfazem a curiosidade e correspondem a interesses do leitor; textos que absorvem o leitor a ponto de o impedirem de escapar à história. Os textos que não afastam o leitor permitem uma experiência agradável, graças a conteúdos que não causam estranheza e a linguagem que não oferece dificuldades. A ausência destas características fragiliza a relação entre o leitor e o texto e frequentemente tem como consequência o abandono da leitura. Os textos que satisfazem a curiosidade e correspondem a interesses do leitor são os que provocam surpresa e incluem novidade e ambiguidade. Os textos que não permitem ao leitor escapar da história são sobretudo os narrativos, que incluem pormenores sedutores, personagens com as quais se possa identificar, palavras que evoquem imagens sugestivas, enredos que surpreendam.
Naturalmente, a forma como estas características atuam sobre o leitor depende dos interesses pessoais ou situacionais, bem como das competências, pois quem lê recria sempre o significado dos textos no quadro das suas experiências possíveis, associando memórias pessoais a elementos imaginários, o que de alguma forma leva o leitor a assumir o papel de autor. Estes requisitos são relevantes na seleção de obras para leitura na sala de aula, porque se a experiência se tornar gratificante, os leitores vão procurar repeti-la.
3. A ciência mostra
O processo de leitura implica várias atividades cognitivas: acesso ao significado das palavras, processamento sintático das frases, relação entre as frases de modo a obter coerência, o que exige, por exemplo, inferir a que se referem os pormenores, relacionar várias partes do texto a fim de preencher omissões e atribuir um significado global que permita a aquisição de uma visão esquemática do conteúdo do texto. A compreensão dos textos varia naturalmente em função do desenvolvimento cognitivo do leitor, do seu domínio da linguagem e dos conhecimentos prévios relativos aos assuntos abordados.
No início da escolaridade, o trabalho na sala de aula tem um impacto decisivo na aprendizagem da decodificação e na compreensão do texto escrito. No entanto, a aquisição de uma competência sólida exige uma prática constante que promova um desenvolvimento gradual, pois o nível de compreensão que as crianças vão adquirindo não depende apenas do ensino, mas também do tempo dedicado à leitura, do contacto da criança com diferentes tipos de livros e da valorização que o professor atribui à atividade leitora.
O acesso a uma grande variedade de livros desde os primeiros anos de escolaridade torna-se central tanto no domínio da linguagem narrativa, como da linguagem informativa. Entre o 3.º e o 4.º ano surgem no currículo escolar áreas de aprendizagem que implicam a aquisição de estratégias específicas para a compreensão de textos informativos. Essas estratégias estimulam o automatismo na leitura, a capacidade de inferir o significado de palavras compostas através da análise da sua estrutura, a capacidade de inferir significados a partir do contexto e dos conhecimentos pessoais e uma maior agilidade no recurso à decodificação de palavras pouco familiares. No 4.º ano de escolaridade as crianças já são bastante hábeis na formulação de generalizações a partir da recolha de informações em textos, e vão compreendendo cada vez melhor a estrutura dos textos informativos. Neste período de escolaridade as crianças continuam a aprofundar o conhecimento das estruturas narrativas, conseguindo, por exemplo, hierarquizar acontecimentos que influenciam o desfecho ou distinguir ideias principais e secundárias. E quanto melhor entendem a estrutura narrativa dos textos, mais facilmente compreendem o respetivo conteúdo.
Os estudos que incidem na leitura por prazer, demonstram tratar-se de uma condição essencial para que os alunos adquiram competência e se tornem leitores. Ler por prazer significa que a pessoa o faz de livre vontade, antecipando a satisfação que irá obter no ato de leitura. No caso de a pessoa o fazer a pedido de outrem, a leitura não é abandonada quando se tornou interessante.
O tempo efetivamente dedicado à leitura, tanto na aula como em tempo livre, torna-se igualmente determinante do progresso da compreensão, tal como as oportunidades para associar a leitura à escrita. Nesta fase da vida das crianças o interesse e a motivação para a leitura condicionam de forma decisiva os progressos na compreensão, cabendo à escola um papel relevante na promoção do gosto pela leitura.
A relação entre a frequência de leitura e o nível de literacia de crianças de 10 anos foi comprovada pelo estudo internacional PIRLS 2016. Na maioria dos países participantes, os alunos que obtiveram melhores resultados foram os que afirmaram ler por prazer todos ou quase todos os dias. As crianças que leem voluntariamente e sem esforço consciente, tornam-se leitores efetivos, enriquecem o seu vocabulário e desenvolvem a capacidade de compreender e utilizar construções gramaticais complexas.
Autoria: Isabel Alçada
Publicação: 10.maio.2021
Não é possível generalizar porque obras adequadas são as que agradam às crianças e nenhum livro consegue agradar a toda a gente. A regra é procurar conhecer os interesses das crianças, se possível envolvê-las na escolha daquilo que se vai ler, levando-as à biblioteca, a livrarias, ou zonas de livros de supermercados e nunca impor.
Para propor que as crianças leiam, ou participem na leitura, devem selecionar-se obras que ofereçam histórias interessantes e compreensíveis, ou seja com uma escrita clara que se torne acessível, considerando o nível de leitura em que as crianças se encontrem. No caso da leitura em voz alta, a linguagem pode ser um pouco mais difícil porque o adulto pode sempre intercalar explicações. No entanto são de evitar obras com estilo antiquado ou rebuscado pois ao exigirem muitas explicações acabam por cortar o ritmo da leitura e gerar desinteresse.
Para adquirir o hábito de leitura livre e autónoma são necessárias muitas experiências de contacto com livros que ajudem as crianças a descobrir obras que lhes deem satisfação, que as façam vibrar afetivamente, porque descobrem novidades, comunicam com as personagens, se divertem ou assustam com as peripécias. Se as primeiras experiências de empatia com os livros ocorrem muito cedo, é mais provável que desejem ler sozinhas e venham a beneficiar das iniciativas da escola e da família para as incentivar a ler nos tempos livres. Mas em qualquer caso pode sempre haver resistências. A regra é continuar a propor leituras atraentes e esperar que a criança adira, sem impor.
Sem dúvida que a leitura na sala de aula é essencial. No primeiro ciclo devem reservar-se momentos diários, em todos os anos de escolaridade, e deve procurar-se que esses momentos sejam bem acolhidos ou mesmo desejados pelas crianças porque os associam a histórias que lhes prendem a atenção, poemas divertidos ou inspiradores, peças engraçadas, informações que descobrem e lhes espicaçam o desejo de saber mais. É bom não esquecer que quem decide a organização do tempo letivo são os professores e como não há dúvida quanto ao valor da leitura orientada na sala de aula para um percurso escolar com sucesso, os professores devem reservar tempo para a realizar.
A família pode ter um papel relevante, mas como algumas não promovem a leitura, a escola pode e deve ajudar dando especial atenção aos alunos dessas famílias, ajudando-os a encontrar na sala de aula e na biblioteca escolar os livros em que os possam tornar leitores confiantes.
As regras a seguir são comuns à escola e à família. Em primeiro lugar é indispensável colocar uma certa diversidade de obras ao alcance das crianças, livros adequados a cada idade, aos gostos de cada uma, ao nível de leitura. Quando começam a saber ler, são úteis os livros com imagens associadas a palavras ou ilustração de cenas associadas a pequenas frases. Depois livros com pouco texto em cada página, histórias ou poemas curtos. Os adultos, familiares ou professores, devem procurar criar rotinas de leitura em voz alta e, à medida que as crianças vão conseguindo ler, devem dar-lhes atenção ouvindo-as, gabando os seus progressos para que ganhem confiança e sintam gosto pela atividade. Também é importante conversar sobre o que leem para que se habituem a verificar e a demonstrar que compreenderam bem os textos ou as histórias.
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O desenvolvimento da literacia inicia-se muito antes da educação formal. O contexto familiar tem um papel importante no desenvolvimento das competências de leitura e escrita e é preditor do sucesso na sua aprendizagem. Aqui abordam-se as experiências vividas em família que potenciam o desenvolvimento linguístico oral e a descoberta da escrita.
Leitores fluentes são capazes de identificar as palavras de forma precisa e automática. Libertam, assim, recursos cognitivos para a compreensão da leitura. Por essa razão, a fluência de leitura tem de ser sistematicamente trabalhada em contexto de sala de aula.