Como outras aprendizagens complexas que ocorrem ao longo do desenvolvimento, como o andar ou a coordenação motora, existe uma considerável variabilidade no ritmo e no padrão de desenvolvimento da linguagem.
Em caso de suspeita de um atraso ou dificuldade de linguagem, o educador deve, em primeiro lugar, procurar identificar o domínio em que a criança tem mais dificuldade (vocabulário pobre, compreensão, expressão…) e dirigir a sua ação para essa área. Por exemplo, se o vocabulário é pobre, pode insistir na leitura em voz alta, explicando o significado das palavras menos frequentes, e procurar situações para a aplicação dos novos vocábulos.
Se, ainda assim, o educador considerar que necessita da opinião de um especialista, ou se as dificuldades persistirem, deve encaminhar a criança para que se proceda a um despiste auditivo e a uma avaliação da linguagem por um especialista (terapeuta da fala ou psicólogo) e recolher informação relativa ao contexto sociofamiliar e às vivências da criança.
Não necessariamente. Durante algum tempo, pensou-se que a exposição a mais do que uma língua era prejudicial ao desenvolvimento linguístico. No entanto, a investigação mais recente neste domínio não o comprova e atualmente investiga-se se ser bilingue pode ou não ter algumas vantagens, quer para o desenvolvimento da linguagem, quer até para o próprio desenvolvimento cognitivo. O que importa assegurar, até se iniciar a aprendizagem formal da leitura e da escrita, é que a criança domina a língua em que vai aprender a ler e a escrever. Para a esmagadora maioria das crianças do nosso país, será o português.
Não. Deve ler-se essa palavra. Se a criança perguntar o seu significado, ele deve ser explicado. No entanto, antes de proceder à explicação, pode-se perguntar à criança o que acha que a palavra pode significar, de modo a estimular a inferência através do contexto. Se a criança não perguntar, o adulto pode convidar a criança a refletir sobre o significado dessa palavra. Exemplo: “O lobo mau fugiu apavorado”. O que quererá dizer “apavorado”?
O que deve ser feito é devolver à criança uma reformulação do que ela disse. Por exemplo, se a criança diz “Eu já "fazi tudo”, a sua ilocução pode ser devolvida dizendo algo do tipo: “Eu também já fiz o meu trabalho muito bem”.
Teoricamente, não. No entanto, o domínio depende do tempo e da sistematicidade de exposição a cada uma delas. Se os pais falam línguas diferentes e no meio ambiente (incluindo a creche ou jardim-de-infância) a língua de comunicação é a de um dos progenitores, é de esperar que o domínio desta última seja superior. Há crianças bilingues que, em contexto de creche ou jardim-de-infância fazem questão de falar a língua deste contexto por sentimento de pertença.
Numa primeira etapa, nomeando objetos, acontecimentos, pessoas, animais, ações, etc., de forma a que as crianças criam representações mentais e desenvolvam o seu vocabulário recetivo (ou léxico passivo). Muito antes de uma criança ser capaz de pronunciar, por exemplo, a palavra “ursinho”, ela será capaz de responder a um pedido para que traga, do cesto dos brinquedos, o ursinho e não qualquer outro brinquedo.
Numa segunda etapa, expandindo o que a criança diz. Falar à criança usando, progressivamente, um discurso mais próximo do discurso adulto. Se na primeira etapa dizer “piu-piu”, “popó” ou “au-au" é uma forma de estimular a passagem da reduplicação silábica para a duplicação silábica, muito rapidamente estes termos devem ser substituídos pelas palavras “galinha” (ou “pássaro”, ou “peru” …), “carro” (ou “autocarro”, ou “camião”) e "cão".
Ler para a criança é uma das estratégias mais completas para a promoção do desenvolvimento linguístico. Além de aprenderem palavras novas, contactam com tempos (e modos) verbais poucas vezes usados no discurso oral e com organizações sintáticas também mais complexas do que as usadas na comunicação oral. A leitura deve ter lugar desde que a criança nasce e não devem ser substituídas palavras que se supõe serem-lhe desconhecidas. É o procedimento oposto, isto é, chamar a atenção para palavras desconhecidas e explorar os seus significados, que contribui para a expansão do vocabulário.
Querer usar palavras novas ou “difíceis” é um sinal de que a criança está atenta às palavras que ouve e a ter um papel ativo no seu próprio desenvolvimento linguístico. Mostra que a criança está a tentar expandir o seu léxico ativo. No entanto, perante palavras novas, é também comum as crianças inferirem significados, os quais podem não ser os corretos.
Exemplo: um menino muito curioso relativamente a marcas e modelos de automóveis viu uma vez um acidente com um carro cor-de-rosa. A irmã disse-lhe: “Olha um acidente”. Dois dias depois, o menino passou por uma montra onde está estava um carro (brinquedo) cor-de-rosa, igual ao que tinha visto, e disse: “Está ali um acidente”. Para ele, “acidente” passou a ser um modelo de automóvel.
A palavra “acidente” ficou gravada no seu léxico e ele convocou-a, mas a associação semântica era errada. Estas incorreções devem ser clarificadas, não numa perspetiva de erro, mas de clarificação de conceitos. Alguns destes erros provocam o riso dos adultos que, em alguns casos, passam a usar a palavra com o sentido errado atribuído pela criança. Este é um comportamento dos adultos que nunca deve ocorrer, não só porque reforça uma conceção errada, mas também porque, em alguns casos, pode ter um impacto negativo na autoestima da criança.
Margarida, uma menina de cinco anos, explicava que a pera vinha da pereira, a maçã da macieira, e as nozes da "nozeira". Este tipo de produção, se bem que seja um erro, indica que a criança está atenta à linguagem oral, que extraiu a regra e que a aplica bem. Falta-lhe apenas aprender o contexto de exceção. É, por isso, um sinal muito positivo e revelador não só da capacidade de atenção e de efetuar inferências, mas também da aquisição de regras morfológicas. O mesmo ocorre em produções como "cãos" ou "faroles".
As crianças apropriam-se da sua língua materna sem necessidade de “lições” de gramática. Convidar as crianças a refletir sobre as menores unidades de sentido da língua permite dirigir a sua atenção para os radicais das palavras e para as suas possibilidades combinatórias. Muitas das palavras desconhecidas que aparecem, por exemplo, nos manuais escolares são palavras morfologicamente complexas e maioritariamente derivadas. Levar as crianças a descobrir os aspetos morfológicos ajuda a promover a expansão do vocabulário e facilita a compreensão da leitura.
Para entender o significado de uma palavra nova, as crianças usam os conhecimentos morfológicos que possuem. Quando “inventam” palavras também estão a usar esses conhecimentos morfológicos. Exemplo: uma criança convidada a olhar para o tamanho do focinho de um cão argumenta que ele não tem um focinho, mas um "foço", já que, em seu entender, se tratava de um focinho demasiado grande para poder merecer o que ela inferia ser o sufixo -inho. O mesmo princípio deve ser adotado no que concerne à sintaxe.
Não. Fonemas são as unidades mínimas, abstratas, da sequência fonológica que constitui uma palavra. Um fonema é um conceito que representamos na nossa mente. A letra é uma unidade do sistema ortográfico. Tem uma realidade física, vê-se. As letras têm nomes e representam fonemas. Por exemplo, a letra “pê” representa o fonema /p/; a letra “ó” representa vários fonemas: /ɔ/, como em “bota”; /o/, como em “gota”; /u/, como em “bonita”.
O ensino da consciência fonológica pode ser realizado utilizando todas essas formas de organização das crianças e todas elas deveriam acontecer. O critério-chave é que todas as crianças tenham oportunidade de experimentar, concretizar, pensar sobre as atividades que estão a acontecer.
Se as atividades metafonológicas forem realizadas apenas em grande grupo, algumas crianças não vão ter a oportunidade de experimentar o que acontece quando se pensa e trabalha com sons de fala. Muito provavelmente, também haverá uma ou outra criança que precisa de um tempo de trabalho individual. Se tal se verificar, é crucial que essas crianças tenham oportunidade de fazer esse trabalho individual, porque esse treino vai ajudar muito os seus ganhos nestas matérias. Trabalhar em pequeno grupo – até seis crianças – deveria ser o formato mais rotineiro para realizar este trabalho.
As capacidades para usar linguagem oral não exigem um esforço consciente para atender aos sons da fala, e manipulá-los; ao contrário, realizar tarefas metafonológicas depende das capacidades da criança para focar a sua atenção nos sons, compará-los, diferenciá-los e identificá-los.
Muitas das crianças que têm dificuldades em realizar tarefas metafonológicas provavelmente também têm algumas fragilidades relativamente à qualidade (especificação, diferenciação) das representações dos sons da fala que têm armazenados na sua memória fonológica. No entanto, essas fragilidades são tão subtis que dificilmente perturbam o uso da linguagem para comunicar.
Na fase pré-escolar, particularmente nos grupos de cinco anos, em muitos jardins de infância, as crianças escrevem os seus nomes e as Educadoras colocam rótulos escritos em várias peças da sala. Não há nenhuma investigação que mostre ser prejudicial ensinar às crianças algumas das letras iniciais dessas palavras e levá-las a tomar consciência dos seus sons/fonemas. Ou seja, preparar o caminho para a consciência dos fonemas. Pelo contrário, há muitos estudos que mostram ser útil iniciar essas aprendizagens antes do ensino formal da leitura.
Nessa linha, jogar com fantoches também produz habitualmente muito sucesso. Um fantoche pode falar de uma maneira peculiar; por exemplo, sílaba a sílaba, ou a arrastar uma determinada estrutura alvo que se quer trabalhar: “rrrrrato, rrrrrua, rrrrrima”; “ffffffigo, fffffava, etc.”.
Depois pode-se pedir às crianças que imitem o fantoche ou identifiquem “o pedacinho de som” que ele produz de forma “engraçada e esquisita”, mostrando também a letra.
Associar o conhecimento de algumas letras e os seus “sons” a palavras escritas não é ensinar a ler, mas prepara para essa aprendizagem; é útil, pois facilita-a. Além disso, fazer este tipo de trabalho no jardim de infância permite assinalar, em tempo particularmente útil, crianças em risco de insucesso, pois aquelas que são lentas a manifestar ganhos e são resistentes às oportunidades de aprendizagem são as que poderão falhar na aprendizagem da leitura.
Sim. Muitos pais já estão convencidos disso e tentam ler para os seus filhos. Contudo, para surtir efeitos positivos, essa leitura em voz alta precisa de obedecer a algumas condições: acontecer num contexto afetivo positivo em que os livros são valorizados e não são uma obrigação, nem para os pais, nem para as crianças. Lê-se por desejo, necessidade e gosto. Como sublinhou Daniel Pennac, o primeiro direito do leitor é não ler.
É naturalmente importante que os livros lidos sejam adequados aos interesses e capacidades das crianças ouvintes. É também importante que essas leituras partilhadas possam ser regulares. Tornar-se um hábito. Se estas condições estiverem reunidas, a criança vai aprender muitos conhecimentos novos sobre o mundo, as personagens das histórias e sobre a linguagem. A leitura por um adulto vai ainda despertar na criança o desejo que José Morais bem caracterizou nas páginas do seu A Arte de Ler: “Ouvir a leitura, em voz alta, pelos pais cria o desejo de ler por si mesmo, desejo tão irresistível como o de caminhar sozinho”.
Compreende o desenvolvimento de determinadas competências, conhecimentos ou atitudes que são percussoras da leitura e da escrita nas crianças em contexto familiar e inicia-se em idades precoces da criança e com o apoio e envolvimento parental. Assume-se na literatura científica como um processo relevante no desenvolvimento das crianças dada a sua eficácia comprovada na promoção da literacia futura das crianças.
Apesar de na literatura estarem identificadas diferentes estratégias promotoras de literacia familiar, as estratégias que implicam envolvimento parental (formais e informais) tendem a ser mais exploradas. Em particular, a leitura partilhada de histórias entre pais e filhos e a tutoria parental sobre aspetos específicos da escrita são as práticas que tendem a apresentar resultados de maior eficácia no futuro desempenho dos jovens leitores.
A leitura conjunta ou partilhada de livros é uma das atividades informais de literacia em contexto familiar mais estudada. É uma das primeiras atividades que pais e filhos fazem por prazer e que possibilita o desenvolvimento da literacia emergente. Por um lado, a linguagem usada nos livros é mais complexa do que a usada tipicamente numa conversa. Por outro lado, a linguagem usada pelas mães durante a leitura é também mais complexa do que a usada nas comunicação mãe-filhos durante outras atividades. Desta forma as crianças são expostas a um vocabulário mais rico e a formas gramaticais e sintáticas novas e com maior grau de dificuldade.
Acresce que durante a leitura conjunta a criança tem a atenção do adulto para clarificar, explicar ou questionar a criança, promovendo o desenvolvimento de novos conhecimentos e reforçando a aprendizagem. Igualmente importante é a capacidade de leitura conjunta ser uma fonte de aprendizagem repetível, uma vez que o mesmo estímulo, o livro ou o texto, pode ser relido em diferentes momentos possibilitando novas aprendizagens, como é o caso particular da aquisição de novo vocabulário.
A investigação tem aprofundado o efeito da leitura de histórias na aprendizagem da leitura das crianças e demonstrou que esta atividade promove, essencialmente, a compreensão da leitura em idades mais avançadas.
Numa fase inicial, a leitura de histórias estimula sobretudo o vocabulário novo nas crianças e o conhecimento implícito da morfologia e sintaxe da língua. Esta atividade não afeta diretamente o seu conhecimento formal da literacia, que normalmente é mais influenciado pelas atividades intencionais e formais de ensino ou tutoria parental da leitura. Como, por exemplo, atividades durante as quais os pais ensinam o nome das letras, a pronúncia e a escrita de algumas palavras ou envolvem os seus filhos em jogos que promovem a aquisição dos conhecimentos específicos envolvidos na decodificação.
No entanto, verificou-se que em idades mais avançadas, quando as crianças já dispõem do domínio da decodificação, o seu nível superior do conhecimento da língua, por exemplo, do vocabulário, facilitará e será um forte preditor dos seus níveis de compreensão da leitura.
Estudos recentes têm evidenciado que mais importante que o nível de escolaridade dos pais, a frequência de leitura parental contribui de forma única para explicar o nível de linguagem oral das crianças, ainda que se pressuponha que para funcionar como um modelo letrado para os filhos, os pais devam ter um nível mínimo de literacia. Estes resultados apoiam a ideia de que os pais quando leem por prazer funcionam como modelos letrados positivos para as suas crianças, podendo influenciar muito significativamente a sua oralidade e incutir o gosto pela leitura que potenciará o desenvolvimento das suas competências de literacia.
Se for ensinado eficazmente, não é necessário instruir o princípio alfabético mês após mês. Trata-se de uma aprendizagem que deve ser adquirida cedo e solidamente. Quando as crianças o apreendem, passam a usá-lo maciçamente e essa prática torna-as cada vez mais capazes de decodificar/codificar bem.
Sim. É muito importante que todas as letras e principais grafemas complexos (grupos de letras e letras com diacríticos) sejam ensinados explicitamente. No decorrer do processo de ensino, provavelmente, algumas crianças vão conseguir induzir os nomes/sons de letras/grafemas não ensinados explicitamente, mas haverá sempre várias crianças que precisam desse ensino explícito.
Algumas crianças conseguem ser bem-sucedidas na descoberta de padrões regulares da linguagem escrita independentemente do método de ensino. No entanto, a maioria das crianças não consegue. É por isso que o ensino do princípio alfabético é tão crucial. Tornar explícito o papel que as letras têm na representação dos sons da fala tem potencial para levar todas as crianças a atingir um nível elevado de decodificação/codificação. Isto é particularmente importante para as crianças que têm dificuldades em entender o funcionamento alfabético e para as que trazem conhecimentos rudimentares, ou nenhuns, quando iniciam a aprendizagem da leitura.
Além disso, saber ler/escrever bem, está longe de ser uma expressão objetiva. Muitas vezes considera-se que uma criança lê/escreve bem quando não dá muitos erros ou quando compreende as ideias principais de um texto. No entanto, ler bem envolve, pelo menos, ler com exatidão, com fluência e com compreensão, atingindo níveis elevados de desempenho. O mesmo pode ser dito para a escrita. Escrever com fluência, com complexidade gramatical e com criatividade depende muito da automatização da codificação. Apreender solidamente o funcionamento do princípio alfabético favorece a aprendizagem de cada uma dessas dimensões da leitura e da escrita.
Antes de iniciar a aprendizagem da leitura e da escrita, a criança, tal como o adulto, é capaz de interpretar figuras mais ou menos complexas, ou seja, compreendê-las: “ler” como um todo. É o que acontece com o símbolo dos cinco anéis dos jogos olímpicos, ou com os logos de marcas como os quatro anéis do automóvel Audi. Sabemos interpretá-las, ou seja, “lemo-las” porque as conhecemos, porque estão representadas na nossa memória (memorizamo-las).
Mas na leitura o que é justamente especial é ela nos permitir ler o que não conhecemos à partida. Neste sentido, é um processo mais criativo do que o simples reconhecimento com base na memória. E isso porque a escrita representa a linguagem de uma maneira estruturada, com base em regras. Em vez de uma enorme sobrecarga de memória, aprender a ler e escrever é antes de mais dispor de uma ferramenta que nos torna autónomos, e que no nosso caso assenta no Princípio Alfabético. A já vasta investigação em psicologia da leitura tem demonstrado de modo inequívoco que, para dominar a ferramenta, a memorização não deve ser o esteio fundamental.
Sim, há diferenças grandes entre as crianças quanto ao ritmo de aprendizagem. Umas até podem chegar à escola já a ler. Geralmente acontece se têm irmãos mais velhos e vivem num ambiente com grande variedade de livros. Outras crianças, mesmo se provenientes de meios letrados, vão ficando para trás em comparação com os colegas. Como outras características de raiz biológica, há uma variedade – em termos mais técnicos, diz-se variabilidade – grande entre os indivíduos. Isto dificulta o trabalho do professor. Já que a taxa de progresso não é igual para todos. É por essa razão que hoje em dia os programas de computador para auxiliar as aprendizagens são adaptativos. Ou seja, a taxa de dificuldade dos exercícios ou jogos varia em função da pessoa, adapta-se a ela, de modo a combinar uma taxa de sucesso razoável com um nível de dificuldade que não exceda em muito a competência do jogador.
Não se deve fazer esse tipo de grupo de palavras para exercitar a escrita ou até a leitura. Um exercício assim não está a dar ao aluno a oportunidade de ter prática consistente numa determinada correspondência grafema-fonema. É a prática consistente – ou seja, o treino do mesmo tipo de correspondência – que permite criar ou fortalecer o estabelecimento de uma determinada representação ortográfica no sistema mente-cérebro. Se o conjunto de estímulos não for consistente, estamos simplesmente a fazer um treino de memorização arbitrária que confunde mais do que ilumina.
Suponhamos uma pianista principiante a aprender a tocar a sua primeira peça. Vai treinar a tocar as notas certas, nas teclas certas. Para praticar, não vai ‘experimentar’ a tocar nas teclas ao lado, na esperança de isso lhe permitir ter melhor controlo motor sobre as notas certas.
Do mesmo modo, para propiciar experiências de leitura e escrita que conduzam ao estabelecimento de procedimentos automatizados, é fundamental a prática maciça de conjuntos coerentes. Por exemplo, num primeiro momento, exercitar um conjunto variado de palavras partilhando uma mesma grafia. Por exemplo: “girafa, geleia, gigante, gelado”, etc. Palavras iniciadas por “ge-” ou “gi-”. E só depois chamar a atenção explícita para a grafia rara “jeito”. O mesmo para o conjunto de palavras começadas por “to-” lido como /tu/, sem misturar com a grafia “tu-”, decorrente da aplicação direta do princípio alfabético (<t> + <u> é sempre igual a /tu/). A escolha de conjuntos de palavras consistentes pode ser feita facilmente recorrendo a bases de dados lexicais como, por exemplo, o PORLEX (ver mais informações aqui).
Não. A caligrafia não é equivalente ao desenho. Na caligrafia a intenção do gesto manual é representar a ortografia das palavras da língua usando um conjunto de sinais gráficos convencionais. Isto significa que, do ponto de vista cognitivo, a caligrafia resulta da integração entre um gesto motor e uma representação ortográfica (ou de modo mais simples, o conhecimento da forma escrita da palavra).
Não, é importante que a criança possa desenvolver uma caligrafia rápida e legível. A rapidez é importante para que a criança possa dedicar mais atenção ao significado e menos à execução do gesto motor. A legibilidade é importante para que outros possam ler a mensagem que a criança quer comunicar. Há, contudo, inegáveis propriedades expressivas e estéticas na caligrafia, pelo que é importante que a criança desenvolva também uma consciência sobre elas.
Sim, é importante que as crianças possam conhecer a norma ortográfica em vigor. Talvez mais importante do que corrigir é assinalar o erro. E trabalhar com a criança no sentido de perceber a dificuldade, ultrapassar o erro e compreender as razões por que uma palavra se escreve de uma determinada forma e não de outra.
Há muitas razões para cometer erros ortográficos, a dislexia pode ser uma delas, especialmente na ortografia portuguesa, que é mais inconsistente no sentido da escrita do que no da leitura. Se os erros são numerosos e persistem, essa é seguramente uma boa razão para encaminhar a criança para uma avaliação especializada.
A investigação tem mostrado que a segmentação de sons de uma palavra (/sɔl/ → /s/- /ɔ/ - /l/) e a fusão de sons pronunciando não o nome das letras mas como os ouvimos na palavra (/s/- /ɔ/ - /l/ →(/sɔl/) são provavelmente os métodos que produzem benefícios mais acentuados na aprendizagem da leitura. Não deve ser esquecido, no entanto, que o seu efeito facilitador depende em grande medida do ensino conjunto das letras.
Dado que a tomada de consciência dos fonemas exige a elaboração de abstrações a partir de formas acústicas variadas – o problema da coarticulação dos sons –, saber pronunciar/articular bem as palavras torna-se um facilitador da tomada de consciência dos fonemas. Por isso, quando, ao falarem, as crianças têm dificuldades em produzir certos sons, isso traduz-se muitas vezes em dificuldades no desenvolvimento de representações abstratas dos sons da fala. No entanto, nem sempre é assim. Tal só acontece quando as dificuldades na fala são persistentes e inesperadas para a idade.
À entrada no 1.º ciclo, espera-se que os sons da fala sejam geralmente bem produzidos, com exceção, para algumas crianças, dos que correspondem aos fonemas /r/ e talvez /ʎ/. Se a articulação incorreta recair nestes sons e/ou for uma manifestação de tipo “sopinha de massa”, normalmente resolve-se no decorrer das aprendizagens e não prejudica significativamente a tomada de consciência dos fonemas.
As atividades que visam a tomada de consciência dos fonemas devem ser acompanhadas do ensino das letras e do ensino do Princípio Alfabético. Portanto, no início da aprendizagem é essencial, mas também durante todo o 1.º ano de escolaridade – e até ao seu final – é útil tornar explícitos os fonemas que se associam a cada grafema, pois é muito provável que várias crianças precisem ainda dessa explicitação. Verificar a qualidade das representações fonémicas regularmente permitirá ir aferindo a necessidade de insistir ou avançar no plano de trabalho. No início do 2.º ano, é muito importante que o/a professora/a se certifique de que essas aquisições estão seguras. Para as crianças que manifestem dificuldades no desenvolvimento das representações abstratas dos sons, esse ensino deve existir sempre.
O nome das letras é frequentemente a porta de entrada para as crianças no mundo da alfabetização, mas há muito mais a aprender sobre elas. Que sons da fala representam? Que correspondências os grafemas estabelecem com os fonemas e vice-versa? É também importante dar conta da variabilidade gráfica das letras, tanto na leitura como na escrita à mão. E, sobretudo, é muito importante que as crianças tenham experiências de leitura e escrita mediadas por um adulto que, em diferentes momentos, possa focar a atenção das crianças nos conhecimentos das letras que elas ainda não aprenderam.
Parece realmente mais complicado falar de inconsistências na leitura e inconsistências na escrita, em vez de simplesmente considerar que há palavras irregulares. Mas esta distinção é útil porque tem em conta uma diferença que existe na ortografia do português: são claras as regras que determinam como se lê, mas algumas dessas regras não servem para determinar como se escreve.
Os exemplos dados sobre a letra <s> e a sequência <ge> ou <gi> demonstram isso mesmo: embora o <s> entre vogais se leia sempre /z/, já o som/fonema /z/ entre vogais se pode escrever com <s> ou com <z>. E também, embora as sequências <ge> e <gi> se leiam sempre /je/ e /ji/, já estas sílabas tanto podem ser escritas com “g” como com jota, dependendo da palavra (“gema”, “jeito”).
Este conhecimento específico, separando leitura de escrita, serve para definir estratégias úteis para a criança que está a aprender, dando-lhe meios de resolver hesitações ou dúvidas de modo ordenado. No exemplo dado, se está a ler, há ‘truques’ que pode aplicar (recorre à regra). Se está a escrever, pode tentar lembrar-se da última vez que viu a palavra escrita; aqui o ‘truque’ é procurar na memória, não é usar a regra da leitura.
Numa fase de aprendizagem em que a criança tem ainda um conhecimento frágil da ortografia, esse tipo de exercícios não é aconselhável. Juntar grafias diferentes num mesmo momento de aprendizagem pode contribuir para aumentar a confusão, em vez de fortalecer traços mnésicos relativos à ortografia de cada uma das palavras. É preferível fazer exercícios com cada palavra em separado, ou grupos de palavras que sejam semelhantes. A escolha de conjuntos de palavras consistentes, tanto para os exercícios de leitura como para os de escrita, é facilitada recorrendo a bases de dados lexicais como, por exemplo, o PORLEX (ver mais informações aqui). Por exemplo, a propósito de “gema”, fazer jogos de associação semântica (“gosto/não gosto”, “sabem bem/mal”, “que cor têm, como se sentem ao tato”, “para que servem as gemas de ovos”, etc.) seguidos da escrita pela criança de duas, três frases ou mais, dependendo da idade ou nível de aprendizagem, usando a palavra “gema”.
A linguagem falada é como um alicerce da linguagem escrita. Conhecer várias palavras, apreciar a força expressiva da fala, ser capaz de se expressar oralmente são aspetos que por si só não conduzem ao domínio da leitura e da escrita, mas que ajudam a que essa nova aprendizagem se faça com sucesso.
Sim, porque é uma maneira de reforçar o conhecimento que a criança tem, ou vai ter, dessa palavra. Não só para eventualmente ficar a conhecer uma palavra nova, no sentido de saber que existe essa palavra, e ter uma ideia do seu significado, mas também para exercitar a articulação no caso de estruturas silábicas mais complexas. E também para ganhar confiança em falar com boa dicção e talvez despertar o seu gosto pela linguagem.
A sequência de letras/grafemas que é apresentada num determinado livro de leitura não obriga a que essa sequência seja a que vai ser adotada. No entanto, como os professores planeiam o ensino numa escola ou agrupamento normalmente em grupo, seria adequado discutir os princípios em que se baseia a sequência de ensino sustentada pela investigação e, em conjunto, planear uma sequência cientificamente apropriada que seja depois usada pelo grupo.
O método fónico sistemático é particularmente eficiente para as fases iniciais de aprendizagem da leitura e da escrita. Quando for necessário, o seu uso deve ser complementado com estratégias de ensino apropriadas ao desenvolvimento da fluência e da compreensão da leitura.
Em estudos realizados com ortografias inconsistentes, como a inglesa, tem vindo a tornar-se mais forte a perspetiva de que poderá haver vantagens em associar, de forma bem planeada, o uso de um método fónico sistemático com o do ensino global pontual para palavras excecionais frequentes. Há, no entanto, que colocar esta informação em perspetiva: nenhum estudo cientificamente sólido mostrou como gerir de forma eficiente esta proposta que, se não for sustentada por conhecimentos aprofundados sobre como funciona o sistema de escrita a ensinar/aprender, pode tornar-se uma forma de fazer “um bocadinho de tudo”, criando-se um risco sério de perder a dimensão do ensino sistemático que dá aos métodos fónicos a sua vantagem.
A investigação mostra que uma parte considerável da aprendizagem da escrita pode ocorrer através da leitura. No entanto, o modo como os sons são representados pela escrita (as relações entre fonemas-grafemas) é geralmente mais complexo e variável do que o modo como as letras são convertidas em sons (as relações grafemas-fonemas). Por isso, aprender a escrever palavras apenas através da leitura torna-se uma limitação.
Quando as pessoas leem, tipicamente prestam atenção aos significados e muitas vezes, particularmente no princípio da aprendizagem, conseguem identificar palavras mesmo não prestando atenção a todos os grafemas que as constituem. Isto acontece mais frequentemente com as crianças que são mais lentas a aprender a escrever. O ensino explícito da escrita é fundamental porque dirige a atenção das crianças para todos os pares som-letra(s) necessários à escrita ortograficamente correta de uma palavra.
A fluência da leitura de palavras apresentadas de forma isolada é uma condição necessária, mas não suficiente, para a fluência de leitura. Esta requer que o leitor efetue uma leitura por unidades de sentido. A pontuação, mas também a compreensão, que ocorre enquanto o leitor lê é essencial para uma leitura expressiva.
Um aluno pode conseguir ler com precisão e velocidade cada uma das palavras de um texto, como se as mesmas não tivessem qualquer relação entre elas. Embora possa, eventualmente, cumprir os requisitos de velocidade e de precisão, só por si, esta leitura dificilmente permite compreender o texto lido.
Não. A velocidade com que um aluno lê um texto tem de ter em consideração os objetivos da leitura. Exemplo: a leitura de um texto expositivo, cuja finalidade principal seja identificar informação relevante para um determinado conteúdo, poderá implicar um ritmo mais lento, de modo a sistematizar os conteúdos e/ou a cotejar a informação nova com os conhecimentos prévios.
Os programas de intervenção na fluência de leitura são eficazes no sentido em que os alunos conseguem apresentar incrementos significativos no número de palavras que conseguem ler corretamente por minuto. Contudo, os resultados da investigação não são consensuais no que concerne ao efeito da intervenção na fluência de leitura na melhoria da compreensão da leitura. Por isso, é necessário ter em consideração que a compreensão envolve múltiplos processos e não apenas a fluência de leitura. Se as dificuldades experimentadas pelo aluno forem exclusivamente ao nível da fluência de leitura, é expectável que uma intervenção neste âmbito seja eficaz e conduza a uma melhoria na compreensão da leitura. Porém, se o aluno apresentar, igualmente, problemas nos outros processos associados à compreensão da leitura, as repercussões ao nível da compreensão da leitura serão limitadas.
A escrita requer várias competências. A fluência em cada uma delas traduz-se em ganhos de fluência na escrita. Particularmente relevante para ganhar fluência na escrita é a automatização da transcrição: recuperar facilmente a ortografia das palavras e ser capaz de as caligrafar ou digitar rapidamente num teclado. Uma das melhores formas de ganhar fluência na escrita de textos é praticando a escrita de textos em múltiplas ocasiões. Os escritores reportam com frequência que a escrita só se melhora escrevendo. Reside aqui a importância de dedicar tempo à escrita de textos para que a fluência possa ser ganha.
A decodificação e o reconhecimento de palavras são habilidades indispensáveis para que a criança seja capaz de compreender o que lê. No entanto, elas não são suficientes já que a leitura requer um uso dessas habilidades combinadas com habilidades de compreensão oral. À luz do modelo simples de leitura, não é possível ler com compreensão na ausência de um (ou de ambos) os grupos de habilidades. Assim, se o aluno consegue decodificar o texto escrito mas não o interpreta corretamente, então muito possivelmente as dificuldades residem no facto de as habilidades de compreensão oral se encontrarem pouco desenvolvidas.
Para um melhor entendimento da natureza das dificuldades de compreensão oral apresenta-se útil recorrer à estrutura das fundações cognitivas. Assim, importará analisar se essas dificuldades se devem a um conhecimento geral limitado e a habilidades inferenciais subdesenvolvidas ou antes a um conhecimento linguístico deficitário. No primeiro caso, as crianças tenderão a exibir problemas em relacionar o significado de cada nova frase no discurso falado com os significados das frases que a precederam, a partir de inferências baseadas no conhecimento geral. No segundo caso, se as dificuldades se centrarem na compreensão de frases, então poderemos estar perante um desenvolvimento insuficiente do conhecimento sintático (relativo à ordem das palavras na frase) ou do conhecimento semântico (relativo ao significado das palavras e morfemas). Já se as dificuldades de compreensão oral derivarem de confusões entre palavras semanticamente distintas mas fonologicamente muito parecidas – os chamados pares-mínimos (e.g., ‘cato-gato’, ‘deserto-decerto’) –, o problema poderá residir no conhecimento fonológico.
Tal como referido no exemplo anterior, a capacidade de extrair significado do texto escrito (compreensão leitora) depende não só de boas habilidades de compreensão oral mas também de boas habilidades de reconhecimento de palavras. Ambas as habilidades têm de estar presentes para que a leitura ocorra. Assim, quando um aluno apresenta uma boa compreensão oral mas é incapaz de reconhecer palavras escritas, de forma precisa e fluente, muito provavelmente as suas dificuldades traduzem um desenvolvimento incipiente das suas habilidades de codificação alfabética. Muitas vezes este subdesenvolvimento é o resultado de uma instrução explícita insuficiente ou de oportunidades de prática limitadas ou até inadequadas (incluindo-se aqui a falta de feedback). Se após o reforço da instrução e de práticas de leitura significativas estas habilidades permanecerem subdesenvolvidas, então as dificuldades poderão advir de um reduzido conhecimento dos conceitos sobre a escrita, do princípio alfabético ou de ambos.
No primeiro caso, o aluno tenderá a exibir um conhecimento limitado sobre as formas e as convenções usadas na escrita para representar o discurso linguístico (por exemplo, desconhecendo que os espaços marcam os limites das palavras ou que a leitura se realiza da esquerda para a direita). Já no segundo caso, as dificuldades poderão traduzir um problema na apropriação do princípio alfabético, isto é, na tomada de consciência de que as letras, e conjuntos de letras, isto é, os grafemas, são usados para representar os fonemas das palavras faladas. De acordo com a estrutura das fundações cognitivas, o conhecimento do princípio alfabético depende de dois conjuntos adicionais de conhecimentos: o conhecimento de letras e a consciência fonémica. Decorre daqui que as dificuldades de decodificação poderão refletir, respetivamente, um baixo desenvolvimento das habilidades de reconhecimento e de manipulação das letras do alfabeto (incluindo a discriminação entre letras visualmente parecidas e entre maiúsculas e minúsculas), ou uma reduzida consciência de que a fala se decompõe em unidades sonoras mínimas, os fonemas, e de que essas unidades podem ser manipuláveis (saber, por exemplo, que as palavras ‘mar’ e ‘paz’ têm três fonemas cada uma, que ‘ar’ e ‘ás’ é o que fica se apagarmos o primeiro fonema e que ‘má’ e ‘pá’ é o que sobra se apagarmos o último fonema).
Sendo habilidades com algum grau de independência, o desenvolvimento da compreensão leitora pressupõe um ensino diferenciado das mesmas, privilegiando-se o reconhecimento de palavras nos anos iniciais da alfabetização e a compreensão oral nos anos seguintes. Ainda assim, a opção por uma abordagem integrada, desde o 1.º ano, direcionada para ambos os grupos de habilidades é a mais aconselhada, principalmente em ortografias mais consistentes, onde a apropriação das correspondências entre grafemas e fonemas é mais rápida devido à sua natureza unívoca.
Vejamos o seguinte exemplo: no início do 1.º ano, o João e a Maria apresentavam habilidades de compreensão oral (CO) medianamente desenvolvidas, mas não eram capazes de reconhecer qualquer palavra escrita (RP). Consequentemente, nenhuma das crianças era capaz de ler (L), pois zero vezes qualquer coisa é sempre zero.
Durante o decurso do ano letivo, ambas as crianças foram alvo de instrução explícita das habilidades de reconhecimento de palavras; no entanto, apenas a Maria viu essa instrução complementada com o ensino de habilidades de compreensão oral. Ao fim de alguns meses, o João e a Maria eram já capazes de decodificar algumas palavras. Admitindo que o desenvolvimento das habilidades de reconhecimento de palavras foi idêntico em ambas as crianças, os ganhos na compreensão leitora foram maiores na que usufruiu de instrução na compreensão da linguagem: 0,4 para a Maria vs. 0,25 para o João.
Sabemos que os anos iniciais da escolaridade são cruciais para fornecer as bases necessárias para alavancar o processo de construção do leitor hábil. Por essa razão, importa adotar práticas pedagógicas que melhor favoreçam a aprendizagem da linguagem escrita. O modelo simples de leitura tem-se revelado uma abordagem teórica bastante útil, por se tratar de um modelo causal direto que vê no reconhecimento de palavras e na compreensão oral a chave para a proficiência leitora. O conhecimento destes dois grupos de habilidades, e respetivas (sub)habilidades representadas na estrutura das fundações cognitivas, abre assim caminho para o desenho de práticas pedagógicas que explicita e intencionalmente as desenvolvam.
Para além de permitir a adoção de práticas pedagógicas direcionadas para a promoção das habilidades cognitivas e linguísticas que melhor predizem a leitura, este modelo tem ainda a vantagem de fornecer uma grelha para aferir o conhecimento que as crianças possuem e que lhes falta adquirir para se tornarem leitores hábeis. Apesar de não responder a como a leitura se desenvolve ao longo do tempo, este modelo permite determinar quanto está desenvolvido num dado momento temporal. Assim, trazer este modelo para a sala de aula vai permitir ao professor ficar a conhecer quais as habilidades cognitivas menos desenvolvidas e, deste modo, adotar práticas pedagógicas diferenciadas, ajustadas às necessidades individuais dos seus alunos. Isto é importante porque na ausência de instrução explícita especificamente direcionada para aquelas habilidades de leitura que se encontrem subdesenvolvidas, a criança tenderá a privilegiar estratégias de aprendizagem menos eficazes (e.g., recurso a pistas visuais e/ou contextuais para ler palavras). Ora, a utilização continuada de estratégias compensatórias ineficazes conduz inevitavelmente à solidificação das dificuldades de aprendizagem, com claras repercussões negativas para a realização académica futura.
Não se deve fazer esse tipo de grupo de palavras para exercitar a escrita ou até a leitura. Um exercício assim não está a dar ao aluno a oportunidade de ter prática consistente numa determinada correspondência grafema-fonema. É a prática consistente – ou seja, o treino do mesmo tipo de correspondência – que permite criar ou fortalecer o estabelecimento de uma determinada representação ortográfica no sistema mente-cérebro. Se o conjunto de estímulos não for consistente, estamos simplesmente a fazer um treino de memorização arbitrária que confunde mais do que ilumina.
Suponhamos uma pianista principiante a aprender a tocar a sua primeira peça. Vai treinar a tocar as notas certas, nas teclas certas. Para praticar, não vai ‘experimentar’ a tocar nas teclas ao lado, na esperança de isso lhe permitir ter melhor controlo motor sobre as notas certas.
Do mesmo modo, para propiciar experiências de leitura e escrita que conduzam ao estabelecimento de procedimentos automatizados, é fundamental a prática maciça de conjuntos coerentes. Por exemplo, num primeiro momento, exercitar um conjunto variado de palavras partilhando uma mesma grafia. Por exemplo: “girafa, geleia, gigante, gelado”, etc. Palavras iniciadas por “ge-” ou “gi-”. E só depois chamar a atenção explícita para a grafia rara “jeito”. O mesmo para o conjunto de palavras começadas por “to-” lido como /tu/, sem misturar com a grafia “tu-”, decorrente da aplicação direta do princípio alfabético (<t> + <u> é sempre igual a /tu/). A escolha de conjuntos de palavras consistentes pode ser feita facilmente recorrendo a bases de dados lexicais como, por exemplo, o PORLEX (ver mais informações aqui).
Embora tenda a ser usada com alguma frequência, uma tarefa assim não é recomendável. Isto porque basta ver uma vez uma palavra escrita de determinada maneira para criar um traço mnésico – não necessariamente robusto, mas ainda assim passível de confundir e enfraquecer o traço mnésico correto. Ver num livro ou num conjunto de palavras para praticar, num exercício ainda por cima fornecido pelo professor, formas ortográficas erradas, é contraproducente: em vez de fortalecer, enfraquece a representação mental apropriada da grafia da palavra ou das correspondências grafema-fonema adequadas naquele contexto.
Podem ser corrigidas, mas o fator determinante é a exposição aos dados da língua. As crianças adquirem a variedade linguística que, à sua volta, é dominante.
Em parte, não e, em parte, sim. De um modo geral, o registo oral é menos formal do que o registo escrito. Essa diferença é grandemente responsável pela exposição a subléxicos distintos. Mas há uma outra diferença que é importante considerar - o registo escrito abre caminho ao contacto com um léxico muito mais diversificado do que o registo oral que depende apenas das relações pessoais e próximas.
O conceito de morfema recebeu muitas definições desde a sua formação, no final do século 19, pelo linguista Baudouin de Courtenay. A definição que agora é mais ou menos consensual é a de que os morfemas são as menores unidades portadoras de significado. Alguns constituintes morfológicos são, de facto, morfemas (é o que se verifica com os radicais simples). Outros constituintes morfológicos não são compatíveis com a definição de morfema, ou porque não são unidades portadoras de significado (como os sufixos temáticos), ou porque incluem mais do que um morfema, como os radicais complexos ou o tema.
Há investigação consolidada que tem dado conta das vantagens do ensino explícito da morfologia nos anos finais do 1.º ciclo, dado que a fluência no mecanismo de decodificação parece então facilitar que, ao lerem melhor as palavras, as crianças possam focar-se nos aspetos morfológicos. No entanto, alguns estudos com crianças mais novas, inclusive pré-escolares, têm documentado benefícios da promoção mais precoce da consciência morfológica através da promoção do vocabulário e do desenvolvimento da linguagem em contextos de oralidade ricos.
Não. Os contrastes de género, que ocorrem em formas como gato / gata ou professor / professora, não são gerados por flexão, porque não são obrigatórios nem sistemáticos. Nos substantivos inanimados (como casa ou carro) não pode haver contrastes de género. Nos substantivos animados pode haver, como nos casos já referidos de gato/gata; professor/professora, ou não, como em testemunha, que é sempre um substantivo feminino, ou em indivíduo, que é sempre masculino. A variação de género pode ser temática, quando o contraste é dado pelo índice temático (e.g., alun(o/a); professor(ø/a)), ou derivacional (cf. conde / condessa) ou resultante do processo de composição (cf. águia-macho / águia-fêmea). Em alguns casos, o contraste de género só é realizado na frase (cf. o atleta / a atleta).
Não. As contrações são o resultado de processos fonéticos, como a assimilação, que intervêm nas fronteiras entre palavras. De um modo geral, o resultado não tem consequências na grafia (cf. bola azul [ˈbɔlaˈzuɫ], as chaves [ɐˈʃavɨʃ], dois rapazes [ˈdojʀɐˈpazɨʃ]). O reconhecimento ortográfico ocorre sobretudo quando a sequência de palavras inclui uma preposição monossilábica e um determinante (cf. à, num) ou um demonstrativo (cf. deste, naquele). Do ponto de vista morfológico, estas palavras assemelham-se a palavras compostas e o que varia é o constituinte da direita, não a preposição.
Sim. A vida está constantemente a solicitar a criação de novas palavras. As novas palavras podem surgir de diversas origens. O léxico é frequentemente enriquecido por empréstimos de outras línguas (cf. briefing), por novos significados atribuídos a palavras já existentes (cf. grosso - 1. espesso, 2. mal-educado) e pelo recurso à gramática morfológica, através dos processos de afixação ou composição.
As palavras existem quando são ou foram usadas pelos falantes, o que nem sempre é fácil de determinar. Os dicionários são instrumentos importantes para verificar a atestação das palavras (para além de outras informações), mas nem todas as palavras usadas pelos falantes estão registadas em dicionários. Um outro instrumento importante para a verificação da atestação das palavras são os corpora lexicais (bases de dados de textos escritos ou de transcrições de interações verbais orais), mas também não é garantido que a não ocorrência das palavras nessas fontes comprove que a palavra não existe. Um terceiro recurso para avaliação da existência das palavras decorre do conhecimento dos processos de formação de palavras. Se a palavra pode resultar da intervenção de um processo de formação de palavras, então a palavra é possível e pode já ter sido ou vir a ser usada pelos falantes (cf. covidário). A existência das palavras depende, na verdade, de um acordo tácito entre o seu uso e a compreensão pelos falantes
Sim. A vida está constantemente a solicitar a criação de novas palavras. As novas palavras podem surgir de diversas origens. O léxico é frequentemente enriquecido por empréstimos de outras línguas (cf. briefing), por novos significados atribuídos a palavras já existentes (cf. grosso - 1. espesso, 2. mal-educado) e pelo recurso à gramática morfológica, através dos processos de afixação ou composição.
As palavras existem quando são ou foram usadas pelos falantes, o que nem sempre é fácil de determinar. Os dicionários são instrumentos importantes para verificar a atestação das palavras (para além de outras informações), mas nem todas as palavras usadas pelos falantes estão registadas em dicionários. Um outro instrumento importante para a verificação da atestação das palavras são os corpora lexicais (bases de dados de textos escritos ou de transcrições de interações verbais orais), mas também não é garantido que a não ocorrência das palavras nessas fontes comprove que a palavra não existe. Um terceiro recurso para avaliação da existência das palavras decorre do conhecimento dos processos de formação de palavras. Se a palavra pode resultar da intervenção de um processo de formação de palavras, então a palavra é possível e pode já ter sido ou vir a ser usada pelos falantes (cf. covidário). A existência das palavras depende, na verdade, de um acordo tácito entre o seu uso e a compreensão pelos falantes
Sim. Há importantes sinergias que leitura e escrita podem criar entre si, por virtude dos mecanismos e conhecimentos que partilham. Como inevitavelmente a escrita implica a leitura, é importante dedicar mais tempo à escrita na sala de aula. Revisões da evidência empírica têm mostrado que a leitura beneficia a escrita, que a escrita melhora a leitura e que currículos que combinam as duas de modo coerente e equilibrado melhoram tanto a leitura como a escrita.
Apesar de na literatura estarem identificadas diferentes estratégias promotoras de literacia familiar, as estratégias que implicam envolvimento parental (formais e informais) tendem a ser mais exploradas. Em particular, a leitura partilhada de histórias entre pais e filhos e a tutoria parental sobre aspetos específicos da escrita são as práticas que tendem a apresentar resultados de maior eficácia no futuro desempenho dos jovens leitores.
O ensino explícito do vocabulário é um dos recursos utilizados para promover a compreensão da leitura. As principais estratégias para a expansão do vocabulário são:
a) a leitura;
b) a modelagem do procedimento de inferência de significado a partir de pistas contextuais
Exemplo: “Agora estou muito cansado, disse ele, pausadamente.” A palavra “pausadamente” deriva da palavra “pausa”, que quer dizer paragem... por isso, “falar pausadamente” deve ser falar com algumas paragens pelo meio… Estava muito cansado… Então, terá falado depressa ou devagar?
c) o ensino direto
Exemplo: fornecendo um glossário no texto a ler ou explicando – antes ou durante a leitura – o significado das palavras que se antecipa serem desconhecidas dos alunos/leitores.
Para que o ensino direto seja realmente eficaz, pode não ser suficiente o fornecimento prévio dos significados das palavras ou expressões eventualmente desconhecidas do leitor. Pode ser necessário complementá-lo com a formulação de novas frases que integrem os vocábulos ou expressões aprendidas. No entanto, um vocábulo pode ser conhecido apenas com um determinado sentido, pelo que é importante apoiar também a compreensão da polissemia. Exemplo: a palavra “manga” pode ser apenas conhecida como sendo a parte de uma peça de vestuário, e não como o nome de um fruto.
Pode ainda acontecer que uma determinada palavra seja conhecida, mas não em associação com outras, como é o caso das expressões idiomáticas. Exemplo: “ficar a ver navios” ou “lágrimas de crocodilo”, gerando confusões e podendo dificultar a compreensão.
À entrada no 1.º ciclo do ensino básico, as características dos alunos, no que aos conhecimentos diz respeito, volta a reposicionar a influência da educação pré-escolar, nomeadamente na ativação da curiosidade das crianças. Crianças curiosas são crianças que dispõem de um maior conhecimento sobre o mundo que as rodeia. São crianças observadoras, que questionam, que levantam hipóteses, que buscam ativamente respostas para as suas dúvidas.
Nos anos pré-escolares, ler para as crianças e proporcionar-lhes práticas culturais diversificadas, como idas ao teatro, a espetáculos, a exposições, a museus, a fábricas, visitas a parques ou sítios arqueológicos, entre muitas outras, falando com elas sobre o que há de novo e interessante para conhecer, são vias eficazes para promover a aquisição de conhecimentos que se irão revelar valiosos para a compreensão da leitura. Questionar as crianças sobre o mundo que as rodeia e procurar, com elas, resposta para as mesmas é outra forma de ampliar estes conhecimentos. Com a aprendizagem da leitura, a criança passa a dispor de uma poderosa ferramenta para adquirir conhecimento. Uma ferramenta que abre as portas de acesso a outras práticas culturais. Não é, por isso, de admirar que os estudos PISA mostrem a ligação estreita entre práticas culturais e compreensão da leitura.
Estes dados justificam a necessidade de, por um lado, contemplar a expansão e/ou de ativação de conhecimentos prévios no ensino da compreensão da leitura, e, por outro lado, a necessidade de ensino explícito de estratégias cognitivas e metacognitivas. Deste modo, os alunos ficam capacitados para o uso de ferramentas que lhes permitam identificar as situações em que é preciso procurar informações que, sendo necessárias para a compreensão, não estão presentes nos textos.
Um conhecimento lexical alargado e uma leitura fluente permitem que a memória de trabalho do leitor não seja sobrecarregada, libertando assim recursos para a extração de sentido. Durante a leitura, se o leitor encontrar muitas palavras cujo significado desconhece ou se ainda revelar esforço para decodificar, terá dificuldades em manter na memória de trabalho a informação já extraída, de modo a que, resolvido o problema da identificação da palavra e do acesso ao seu significado, possa progredir ao nível da compreensão.
Os alunos que conseguem reter mais informação na memória de trabalho terão mais facilidade em gerar inferências e em efetuar conexões entre as diferentes partes do texto. Se a memória de trabalho se encontrar sobrecarregada, nomeadamente pelo esforço despendido na identificação das palavras escritas, poderá ser mais difícil ao aluno, em simultâneo, desativar ou ignorar informação irrelevante ao nível do próprio texto, bem como convocar os conhecimentos prévios necessários ao processamento da informação.
A leitura fluente, isto é, uma leitura precisa, expressiva e automatizada, é importante para que a compreensão ocorra, porém não é suficiente para assegurar que o leitor consegue compreender um texto.
Em línguas como o português, grande parte das palavras pode ser lida aplicando as regras de conversão grafema-fonema. Por exemplo, pode-se “ler” de forma silabada a palavra “sardanapalo”, pronunciando-a corretamente, isto é, decodificando-a. Esta decodificação não assegura o acesso ao significado, isto é, a palavra foi bem decodificada mas se o seu significado não é conhecido e o texto não possui pistas para a sua inferência, a compreensão não ocorre.
A sobrevalorização da importância atribuída à decodificação é, talvez, responsável por um dos equívocos no ensino da compreensão da leitura – o de considerar que, uma vez adquirido o sistema de notação (vulgo, código), o aluno passará a ser capaz de compreender o que lê. A extração e a construção de significado(s) exigem ao leitor o funcionamento articulado de um enorme conjunto de processos, como a convocação de conhecimentos prévios, a ativação de processos que envolvem efetuar previsões, realizar inferências, construir imagens mentais, elaborar sínteses, monitorizar a compreensão, entre outros. Ajudar os alunos a lidar com esta complexidade exige ensino explícito. Não é também suficiente a prescrição “ler, ler, ler muito”. Por si só, a prática de leitura ”solitária” não assegura a maximização da compreensão.
Não. Tratando-se de perguntas que implicam a localização de informação explícita no texto – as mais utilizadas nos primeiros anos de escolaridade – o aluno poderá conseguir responder corretamente às mesmas, mas tal não significa que compreenda essa mesma informação e/ou que seja capaz de identificar os aspetos-chave do texto. Se as perguntas não abarcarem todos os níveis de compreensão e os diferentes momentos de leitura (antes-durante-depois) e se não apoiarem a explicitação dos processos linguísticos e cognitivos a convocar, serão uma estratégia de ensino manifestamente insuficiente. A compreensão é um processo complexo, por isso, o foco exclusivo num único fator raramente será suficiente para que ocorram mudanças significativas na compreensão da leitura.
O ensino explícito da compreensão da leitura requer a elaboração de tarefas que contemplem diferentes níveis de compreensão e que, em simultâneo, guiem o leitor na reflexão sobre o trabalho cognitivo (e linguístico) que lhe está ser exigido. Necessita de uma variedade de géneros e tipos de textos e uma escolha muito criteriosa dos mesmos. Eles vão ser, a par do professor, uma das pedras angulares para o ensino da compreensão da leitura. No contexto de ensino inicial da leitura, os textos narrativos – essencialmente contos, lendas e fábulas – são os mais utilizados, em detrimento de textos expositivos, esperando-se, do leitor, uma generalização de estratégias. No entanto, há diferenças significativas entre os dois tipos de texto ao nível dos objetivos. Essas diferenças conduzem a estruturas distintas e que colocam também exigências distintas ao leitor.
A explicação reside nas diferenças substanciais ao nível da estrutura, do vocabulário utilizado e dos conhecimentos prévios requeridos. As crianças contactam, desde muito cedo, com a estrutura-tipo dos textos narrativos (introdução, desenvolvimento e resolução), o que não acontece com os textos expositivos. O contacto precoce, a par do facto de a estrutura dos textos narrativos ser relativamente previsível, facilita a compreensão das ideias principais. A estrutura dos textos expositivos é muito mais imprevisível, podendo assumir, entre outras, a forma de descrição, de comparação e de contraste. O vocabulário é, geralmente, mais técnico e/ou científico, pelo que o seu significado, se desconhecido, é mais difícil de inferir através de pistas contextuais. Além disso, os textos expositivos exigem conhecimentos prévios sobre os conteúdos abordados, sem os quais poderá não será possível processar a informação nele inserta. A investigação mostra que a utilização dos dois tipos de textos é importante no ensino explícito da compreensão da leitura.
De modo recorrente, a investigação tem mostrado o efeito positivo da intervenção nas estratégias de leitura e na metacompreensão. Porém, a compreensão da leitura é um processo complexo, pelo que, ao analisar os efeitos da intervenção num dos fatores, é sempre necessário ponderar a sua interação com os outros. Quando, por exemplo, os alunos dispõem de conhecimentos gerais reduzidos sobre a estrutura dos textos e/ou sobre conteúdos, problemas na fluência de leitura e perceções débeis de autoeficácia, os efeitos do treino de estratégias podem ser limitados.
A metacompreensão é considerada essencial para a compreensão da leitura, uma vez que permite a regulação da compreensão. Esta regulação traduz-se em aspetos diversos, tais como a planificação da leitura em função dos objetivos da mesma, a sua monitorização, a avaliação das informações (conhecimentos prévios) de que o leitor dispõe e o modo como usa esse conhecimento para compreender o que está a ler. Acresce ainda que a monitorização permite ao leitor identificar inconsistências no texto lido, bem como perceber que não está a compreender o que está a ler. A capacidade de autoavaliar a compreensão do que se lê é crucial para a aprendizagem em todos os domínios de conhecimento e ao longo do ciclo de vida.
O ensino recíproco visa o ensino de estratégias adotando os princípios da aprendizagem cooperativa. Implica uma organização da turma em pequeno grupo. Os alunos leem um texto que, de seguida, é alvo de discussão. Nesta discussão são ensinadas e/ou modeladas estratégias de leitura de forma explícita. Cabe ao professor:
a) orientar a análise do texto;
b) mostrar aos alunos que estratégias devem usar (quais e quando);
c) modelar a sua utilização;
d) dar feedback;
e) apoiar os alunos quando necessário.
São quatro as estratégias cujo treino é sugerido:
1. Questionar: convidar os alunos a efetuarem perguntas sobre um parágrafo, a fim de facilitar a identificação da informação mais importante, a localização das ideias principais e a monitorização da compreensão;
2. Esclarecer: identificar e fazer pausas em palavras e/ou frases difíceis de compreender;
3. Resumir: sintetizar as ideias principais de um período, parágrafo ou excerto;
4. Prever: efetuar previsões sobre o conteúdo do texto que ainda falta ler.
É reconhecido que o ensino explícito de estratégias de leitura e de metacompreensão é complexo, exigindo formação específica. Por um lado, a formação dos professores é, neste âmbito, bastante limitada, à qual acresce o facto de tarefas com estes objetivos estarem praticamente ausentes nos manuais de Português do 1.º ciclo do ensino básico. Por outro lado, exige que os alunos sejam capazes de pensar sobre o pensamento e de comunicar oralmente o que estão a pensar. Muitos alunos têm dificuldades de expressão oral, pelo que estas limitam a sua capacidade de explicar o modo como compreenderam, como descobriram que não estavam a compreender e que estratégias utilizaram para lidar com as dificuldades de compreensão que encontraram.
Sim, claro! O único critério é que essa mnemónica possa ser facilmente memorizada. Igualmente importante é que essa estratégia de escrita seja utilizada pelo aluno quando ela lhe possa ser útil. Para isso, vários textos devem ser escritos fazendo uso da estratégia. Inicialmente, esta pode ser introduzida com ilustrações e organizadores gráficos. Depois, esses elementos vão sendo progressivamente retirados. Quando a mnemónica estiver interiorizada, bastará a sua evocação para auxiliar na escrita do texto.
Não é possível generalizar porque obras adequadas são as que agradam às crianças e nenhum livro consegue agradar a toda a gente. A regra é procurar conhecer os interesses das crianças, se possível envolvê-las na escolha daquilo que se vai ler, levando-as à biblioteca, a livrarias, ou zonas de livros de supermercados e nunca impor.
Para propor que as crianças leiam, ou participem na leitura, devem selecionar-se obras que ofereçam histórias interessantes e compreensíveis, ou seja com uma escrita clara que se torne acessível, considerando o nível de leitura em que as crianças se encontrem. No caso da leitura em voz alta, a linguagem pode ser um pouco mais difícil porque o adulto pode sempre intercalar explicações. No entanto são de evitar obras com estilo antiquado ou rebuscado pois ao exigirem muitas explicações acabam por cortar o ritmo da leitura e gerar desinteresse.
Para adquirir o hábito de leitura livre e autónoma são necessárias muitas experiências de contacto com livros que ajudem as crianças a descobrir obras que lhes deem satisfação, que as façam vibrar afetivamente, porque descobrem novidades, comunicam com as personagens, se divertem ou assustam com as peripécias. Se as primeiras experiências de empatia com os livros ocorrem muito cedo, é mais provável que desejem ler sozinhas e venham a beneficiar das iniciativas da escola e da família para as incentivar a ler nos tempos livres. Mas em qualquer caso pode sempre haver resistências. A regra é continuar a propor leituras atraentes e esperar que a criança adira, sem impor.
Sem dúvida que a leitura na sala de aula é essencial. No primeiro ciclo devem reservar-se momentos diários, em todos os anos de escolaridade, e deve procurar-se que esses momentos sejam bem acolhidos ou mesmo desejados pelas crianças porque os associam a histórias que lhes prendem a atenção, poemas divertidos ou inspiradores, peças engraçadas, informações que descobrem e lhes espicaçam o desejo de saber mais. É bom não esquecer que quem decide a organização do tempo letivo são os professores e como não há dúvida quanto ao valor da leitura orientada na sala de aula para um percurso escolar com sucesso, os professores devem reservar tempo para a realizar.
A família pode ter um papel relevante, mas como algumas não promovem a leitura, a escola pode e deve ajudar dando especial atenção aos alunos dessas famílias, ajudando-os a encontrar na sala de aula e na biblioteca escolar os livros em que os possam tornar leitores confiantes.
As regras a seguir são comuns à escola e à família. Em primeiro lugar é indispensável colocar uma certa diversidade de obras ao alcance das crianças, livros adequados a cada idade, aos gostos de cada uma, ao nível de leitura. Quando começam a saber ler, são úteis os livros com imagens associadas a palavras ou ilustração de cenas associadas a pequenas frases. Depois livros com pouco texto em cada página, histórias ou poemas curtos. Os adultos, familiares ou professores, devem procurar criar rotinas de leitura em voz alta e, à medida que as crianças vão conseguindo ler, devem dar-lhes atenção ouvindo-as, gabando os seus progressos para que ganhem confiança e sintam gosto pela atividade. Também é importante conversar sobre o que leem para que se habituem a verificar e a demonstrar que compreenderam bem os textos ou as histórias.
Aprender a ler é como aprender a andar de bicicleta: primeiro é uma atividade extenuante (manter o equilíbrio, olhar para a frente, conseguir dar mais do que uma pedalada) mas que, com treino sistemático, se torna depois uma atividade automática. Tal como andar de bicicleta, no início é difícil! Por isso se demora muito tempo a ler.
Para extrair as ideias principais, a criança tem de compreender o que está a ler. Mas se a leitura for lenta, laboriosa, e a atenção estiver concentrada na decodificação, restará pouco espaço mental para interpretar o que está a ser (e foi) lido. Assim, extrair ideias ou resumir o que se leu será um desafio avassalador. A rapidez na leitura indica que a leitura é automática e é essa rapidez que permite à criança ter espaço mental disponível para compreender o que leu. Para que a automatização da decodificação ocorra, o ensino da leitura (i.e., do princípio alfabético, das regras de correspondência grafema-fonema e das suas exceções) e o seu treino direto têm de ser intensivos, sistemáticos, continuados e explícitos, com vários momentos de leitura e atividades ativas realizadas pela criança (ver Por uma intervenção precoce e aprendizagem da leitura ativa).
A leitura fluente, ou seja, uma decodificação automática e rápida, permite libertar recursos atencionais que podem ser orientados para outros processos mentais, incluindo a compreensão. Só assim percebemos o que lemos. Contudo, a compreensão de textos não depende apenas da decodificação automática. Também depende do conhecimento linguístico oral e do vocabulário. Dito de outro modo, temos de conhecer o significado das palavras (vocabulário) para percebermos o que lemos. Por exemplo, na frase “a diatribe foi nefasta para o António”, se não conhecermos o significado de <diatribe> ou de <nefasto>, podemos até ler rapidamente, mas não conseguiremos entender por que razão na imagem que acompanha a frase está um menino (supostamente o António) a chorar! Portanto, se por um lado, a decodificação automática facilita a compreensão, a compreensão depende das competências linguísticas orais (incluindo o vocabulário), o que não se circunscreve ao domínio da leitura.
Aprender a ler implica decodificar. Uma criança que usa estratégias de adivinhação, como no exemplo dado (ver Despiste e intervenção precoce - Quadro 2), não percebeu ainda o que é ler. Ler não é adivinhar, ler é fazer corresponder toda a sequência escrita (tendo em conta as letras e a ordem das letras que constituem essa sequência; ROCA e ORCA são diferentes) à sua expressão oral, usando as regras de correspondência grafema-fonema. Para que a criança entenda este código, o ensino do princípio alfabético e das regras de correspondência grafema-fonema e das suas exceções tem de ser explícito, sistemático, continuado e repetido e deverá conter cinco fatores-chave:
1. Consciência fonémica;
2. Treino fónico do princípio alfabético e das correspondências grafema-fonema;
3. Compreensão oral
4. Fluência de leitura;
5. Vocabulário (ver Por uma intervenção precoce e aprendizagem da leitura ativa).
As dificuldades na aprendizagem da leitura dependem também do grau de complexidade do código ortográfico em que se aprende a ler e a escrever. Por exemplo, em Português Europeu, o som /s/ (como em ) pode ser escrito com recurso a vários grafemas, como ilustrado na palavra <SUCESSO>, e o grafema <o> pode corresponder a fonemas diferentes, como em <BOCA> e <TOCA>, o que torna mais complexo o código do que em ortografias transparentes. É a esta complexidade que habitualmente se chama “casos de leitura”, que envolvem na realidade vários tipos de casos.
Exemplos:
1. Em “an/am” e “rr/r”, para que a leitura (ou a escrita) seja bem-sucedida, a criança tem de saber explicitamente quais são as regras a usar. Estes casos dizem respeito à necessidade de conhecer as regras contextuais e posicionais de correspondência grafema – fonema. Pensemos nestas regras como as de um jogo: se não as soubermos explicitamente, nunca saberemos se estamos a jogar bem ou a fazer batota. Sempre que uma regra possa ser explicitada, deve sê-lo de forma repetida, sistemática e continuada. Não escondamos da criança as regras que a podem ajudar a dominar a leitura e a escrita mais facilmente. Por exemplo, <am> e <an> podem corresponder ambos ao som /ã/, a diferença é que o primeiro se adota quando a consoante que se segue é <b> ou <p> (e.g., campo; tombo), enquanto o segundo se adota nos outros casos (e.g., canto; tonto). Para a leitura destes grafemas complexos, em que não é uma letra, mas um conjunto de letras que corresponde a um som, é igualmente útil ter já introduzido outros grafemas complexos que não colocam dificuldades contextuais. Por exemplo, os dígrafos <nh> e <ch> não devem ser deixados para o fim. Estes grafemas complexos correspondem sempre a um único som de forma biunívoca e permitem à criança compreender que um conjunto de letras pode corresponder a um som (e vice-versa). O treino permite mais tarde que a criança entenda facilmente que <am> pode corresponder ao som /ã/.
2. Existem os casos em que a ligação entre a expressão falada e a escrita não é linear, quando um grafema não corresponde a um único fonema e vice-versa.
3. Por último, os reais “casos” em que não existe uma regra. O grafema <x> é o grafema que coloca esta questão em Português, uma vez que pode corresponder a vários fonemas sem uma regra clara e de fácil explicitação. Palavras como <peixe>, <máximo>, <táxi>, <exame> serão lidas corretamente de forma sistemática só quando forem conhecidas da criança. Aqui a regra é explicitar à criança que não há uma verdadeira regra, que é preciso conhecer a forma escrita exata destas palavras para que as possamos ler e escrever corretamente. Em outras situações, a raiz morfológica da palavra é a razão da irregularidade, a desobediência à regra. Por exemplo, <linguística>, em que o <u> que segue o <g> é lido, não faz parte do grafema <gu>, porque a palavra deriva da palavra <língua>. Apenas o ensino explícito e o treino sistemático, continuado e consistente podem ajudar a criança a superar estes desafios.
Esta questão encerra em si vários fatores-chave implicados no desafio da aprendizagem da leitura, ou seja: “má leitura”; dificuldades de aprendizagem da leitura; dislexia; quando intervir; obter um diagnóstico. A leitura não é uma atividade espontânea, exige ensino explícito. A sua ligação com a linguagem oral não é intuitiva. Uma leitura de sucesso ou “boa leitura” implica uma leitura fluente com compreensão do significado daquilo que foi lido, e muitas competências estão envolvidas. A sua aprendizagem envolve esforço e ensino sistemático, continuado e explícito. Por isso, é natural que a aprendizagem da leitura seja um desafio para todas as crianças.
Dada a multiplicidade de influências (fatores extrínsecos e intrínsecos ao leitor), as dificuldades de aprendizagem da leitura não refletem necessariamente uma perturbação específica de desenvolvimento da leitura, isto é, de dislexia. Aliás, apenas uma percentagem reduzida de crianças com dificuldades de aprendizagem de leitura tem dislexia. Assim, esperar para ver nunca será uma boa solução; nenhuma criança se torna um leitor com dificuldades aos 15 anos, salvo situações excecionais. Se, por um lado, existem sinais desde uma fase precoce que podem indiciar possíveis dificuldades de leitura (ver Despiste e intervenção precoce - Quadros 1 e 2), por outro lado existem atividades que o educador e o professor podem utilizar para um ensino mais eficaz desde a idade pré-escolar (ver Por uma intervenção precoce e aprendizagem da leitura ativa).
Finalmente, se o ensino e o treino sistemático, continuado, explícito, com envolvimento ativo e motivado da criança, não se revelarem eficazes, a avaliação de dificuldades de aprendizagem da leitura exige uma avaliação neuropsicológica rigorosa, feita por psicólogos com especialização em neuropsicologia. São estes os técnicos para os quais potenciais dificuldades devem ser orientadas. É, contudo, importante salientar que identificar e diagnosticar de nada serve se depois os meios de apoio e intervenção não estiverem disponíveis desde um momento precoce e com eficácia assegurada (ver Intervenção).
Haverá sempre crianças para quem a aprendizagem da leitura é um desafio maior, mesmo quando o ensino da leitura é excelente. Contudo, este número será certamente menor e as dificuldades mais manejáveis se o ensino em sala de aula para todas as crianças usar estratégias de instrução eficazes desde uma fase precoce (ver Métodos fónicos).
Esta questão encerra em si vários fatores-chave implicados no desafio da aprendizagem da leitura, ou seja: “má leitura”; dificuldades de aprendizagem da leitura; dislexia; quando intervir; obter um diagnóstico. A leitura não é uma atividade espontânea, exige ensino explícito. A sua ligação com a linguagem oral não é intuitiva. Uma leitura de sucesso ou “boa leitura” implica uma leitura fluente com compreensão do significado daquilo que foi lido, e muitas competências estão envolvidas. A sua aprendizagem envolve esforço e ensino sistemático, continuado e explícito. Por isso, é natural que a aprendizagem da leitura seja um desafio para todas as crianças.
Dada a multiplicidade de influências (fatores extrínsecos e intrínsecos ao leitor), as dificuldades de aprendizagem da leitura não refletem necessariamente uma perturbação específica de desenvolvimento da leitura, isto é, de dislexia. Aliás, apenas uma percentagem reduzida de crianças com dificuldades de aprendizagem de leitura tem dislexia. Assim, esperar para ver nunca será uma boa solução; nenhuma criança se torna um leitor com dificuldades aos 15 anos, salvo situações excecionais. Se, por um lado, existem sinais desde uma fase precoce que podem indiciar possíveis dificuldades de leitura (ver Despiste e intervenção precoce - Quadros 1 e 2), por outro lado existem atividades que o educador e o professor podem utilizar para um ensino mais eficaz desde a idade pré-escolar (ver Por uma intervenção precoce e aprendizagem da leitura ativa).
Finalmente, se o ensino e o treino sistemático, continuado, explícito, com envolvimento ativo e motivado da criança, não se revelarem eficazes, a avaliação de dificuldades de aprendizagem da leitura exige uma avaliação neuropsicológica rigorosa, feita por psicólogos com especialização em neuropsicologia. São estes os técnicos para os quais potenciais dificuldades devem ser orientadas. É, contudo, importante salientar que identificar e diagnosticar de nada serve se depois os meios de apoio e intervenção não estiverem disponíveis desde um momento precoce e com eficácia assegurada (ver Intervenção).
Esta questão encerra em si vários fatores-chave implicados no desafio da aprendizagem da leitura, ou seja: “má leitura”; dificuldades de aprendizagem da leitura; dislexia; quando intervir; obter um diagnóstico. A leitura não é uma atividade espontânea, exige ensino explícito. A sua ligação com a linguagem oral não é intuitiva. Uma leitura de sucesso ou “boa leitura” implica uma leitura fluente com compreensão do significado daquilo que foi lido, e muitas competências estão envolvidas. A sua aprendizagem envolve esforço e ensino sistemático, continuado e explícito. Por isso, é natural que a aprendizagem da leitura seja um desafio para todas as crianças.
Dada a multiplicidade de influências (fatores extrínsecos e intrínsecos ao leitor), as dificuldades de aprendizagem da leitura não refletem necessariamente uma perturbação específica de desenvolvimento da leitura, isto é, de dislexia. Aliás, apenas uma percentagem reduzida de crianças com dificuldades de aprendizagem de leitura tem dislexia. Assim, esperar para ver nunca será uma boa solução; nenhuma criança se torna um leitor com dificuldades aos 15 anos, salvo situações excecionais. Se, por um lado, existem sinais desde uma fase precoce que podem indiciar possíveis dificuldades de leitura (ver Despiste e intervenção precoce - Quadros 1 e 2), por outro lado existem atividades que o educador e o professor podem utilizar para um ensino mais eficaz desde a idade pré-escolar (ver Por uma intervenção precoce e aprendizagem da leitura ativa).
Finalmente, se o ensino e o treino sistemático, continuado, explícito, com envolvimento ativo e motivado da criança, não se revelarem eficazes, a avaliação de dificuldades de aprendizagem da leitura exige uma avaliação neuropsicológica rigorosa, feita por psicólogos com especialização em neuropsicologia. São estes os técnicos para os quais potenciais dificuldades devem ser orientadas. É, contudo, importante salientar que identificar e diagnosticar de nada serve se depois os meios de apoio e intervenção não estiverem disponíveis desde um momento precoce e com eficácia assegurada (ver Intervenção).
Aprender a ler implica decodificar. Uma criança que usa estratégias de adivinhação, como no exemplo dado (ver Despiste e intervenção precoce - Quadro 2), não percebeu ainda o que é ler. Ler não é adivinhar, ler é fazer corresponder toda a sequência escrita (tendo em conta as letras e a ordem das letras que constituem essa sequência; ROCA e ORCA são diferentes) à sua expressão oral, usando as regras de correspondência grafema-fonema. Para que a criança entenda este código, o ensino do princípio alfabético e das regras de correspondência grafema-fonema e das suas exceções tem de ser explícito, sistemático, continuado e repetido e deverá conter cinco fatores-chave:
1. Consciência fonémica;
2. Treino fónico do princípio alfabético e das correspondências grafema-fonema;
3. Compreensão oral
4. Fluência de leitura;
5. Vocabulário (ver Por uma intervenção precoce e aprendizagem da leitura ativa).
Ao contrário da linguagem oral, leitura e escrita não são atividades espontâneas e inerentes ao ser humano. Mais importante ainda, se, por um lado, leitura e escrita são atividades associadas e que se beneficiam mutuamente, por outro lado, são atividades distintas. É, por isso, possível uma criança ter dificuldades na escrita, não revelando as mesmas dificuldades na leitura. Isto é especialmente observado em línguas cuja ortografia não é transparente, para as quais um grafema não corresponde linearmente a um único fonema e vice-versa, como acontece em Português. Além disso, em português europeu, a mestria da escrita é mais difícil de alcançar do que a mestria da leitura. O conhecimento das regras de correspondência grafema-fonema será suficiente na maioria dos casos para uma leitura correta do português. Contudo, no caso da escrita, é necessário que saibamos qual a constituição ortográfica exata da palavra. Por exemplo, a palavra <MÁXIMO> poderia, desconhecendo-se a sua forma ortográfica, ser escrita como <mássimu>, mas esta não é a representação ortográfica correta.
Como leitura e escrita não são simplesmente uma cópia visuomotora da linguagem oral, estando sujeitas a constrangimentos diferentes, também a sua correspondência pode ser difícil. Por exemplo, na fala corrente, a palavra <PERIGO> é produzida com a sílaba inicial /pri/. Esta discrepância entre a versão escrita e oralizada da mesma palavra pode dar origem a dificuldades na sua escrita correta, porque, usando as regras de conversão fonema-grafema do português e desconhecendo a forma escrita <prigo>, seria a forma adequada para grafar a palavra oral. É por isso que algumas crianças apresentam dificuldade na escrita de palavras em que a discrepância entre fala e escrita é notória, como acontece também em palavras que contêm <re> e <er> como em <PRESENTE> ou <PERFEITO>.
Haverá sempre crianças para quem a aprendizagem da leitura é um desafio maior, mesmo quando o ensino da leitura é excelente. Contudo, este número será certamente menor e as dificuldades mais manejáveis se o ensino em sala de aula para todas as crianças usar estratégias de instrução eficazes desde uma fase precoce (ver Métodos fónicos).
Ao contrário da linguagem oral, leitura e escrita não são atividades espontâneas e inerentes ao ser humano. Mais importante ainda, se, por um lado, leitura e escrita são atividades associadas e que se beneficiam mutuamente, por outro lado, são atividades distintas. É, por isso, possível uma criança ter dificuldades na escrita, não revelando as mesmas dificuldades na leitura. Isto é especialmente observado em línguas cuja ortografia não é transparente, para as quais um grafema não corresponde linearmente a um único fonema e vice-versa, como acontece em Português. Além disso, em português europeu, a mestria da escrita é mais difícil de alcançar do que a mestria da leitura. O conhecimento das regras de correspondência grafema-fonema será suficiente na maioria dos casos para uma leitura correta do português. Contudo, no caso da escrita, é necessário que saibamos qual a constituição ortográfica exata da palavra. Por exemplo, a palavra <MÁXIMO> poderia, desconhecendo-se a sua forma ortográfica, ser escrita como <mássimu>, mas esta não é a representação ortográfica correta.
Como leitura e escrita não são simplesmente uma cópia visuomotora da linguagem oral, estando sujeitas a constrangimentos diferentes, também a sua correspondência pode ser difícil. Por exemplo, na fala corrente, a palavra <PERIGO> é produzida com a sílaba inicial /pri/. Esta discrepância entre a versão escrita e oralizada da mesma palavra pode dar origem a dificuldades na sua escrita correta, porque, usando as regras de conversão fonema-grafema do português e desconhecendo a forma escrita <prigo>, seria a forma adequada para grafar a palavra oral. É por isso que algumas crianças apresentam dificuldade na escrita de palavras em que a discrepância entre fala e escrita é notória, como acontece também em palavras que contêm <re> e <er> como em <PRESENTE> ou <PERFEITO>.
Leitura e escrita não são simplesmente uma cópia da linguagem oral. Por exemplo, <PERIGO> e <PRIMO> são, na fala, produzidas da mesma forma, com a sílaba inicial /pri/. Podemos, claro, acentuar o som /ə/ na palavra , mas não é assim que falamos naturalmente! Esta discrepância pode dar origem a dificuldades na leitura ou na escrita correta da primeira palavra ou de palavras em que a ligação entre a forma falada e a forma escrita é ainda mais difícil (e.g., perfeito e presente). A explicitação destes casos, o seu treino sistemático, continuado e repetido são boas estratégias para a criança entender que não se fala como se escreve, que existem regras de correspondência e que a forma escrita de uma palavra é específica e tem de ser aprendida.
A investigação tem demonstrado que o uso de computadores ou de formas informatizadas de intervenção tem um impacto pequeno na magnitude de eficácia de um programa de intervenção de leitura (Cheung & Slavin, 2013). Contudo, existe alguma evidência do uso destas tecnologias em intervenções com crianças com dificuldades de leitura ser mais eficaz entre o 1.º e o 3.º ano, especialmente quando o programa é muito intenso com tempo superior a 1h15m por semana, realizado em conjunto com intervenções tradicionais, por exemplo, com professores e em pequenos grupos, e com ênfase em atividades de treino fonémico. O que determina a eficácia de um treino informatizado dirigido a crianças com dificuldades de leitura é a natureza do treino (em que competências incide), o papel do professor, e a natureza, qualidade, e intensidade da intervenção convencional com que é combinado.
Esta questão encerra em si vários fatores-chave implicados no desafio da aprendizagem da leitura, ou seja: “má leitura”; dificuldades de aprendizagem da leitura; dislexia; quando intervir; obter um diagnóstico. A leitura não é uma atividade espontânea, exige ensino explícito. A sua ligação com a linguagem oral não é intuitiva. Uma leitura de sucesso ou “boa leitura” implica uma leitura fluente com compreensão do significado daquilo que foi lido, e muitas competências estão envolvidas. A sua aprendizagem envolve esforço e ensino sistemático, continuado e explícito. Por isso, é natural que a aprendizagem da leitura seja um desafio para todas as crianças.
Dada a multiplicidade de influências (fatores extrínsecos e intrínsecos ao leitor), as dificuldades de aprendizagem da leitura não refletem necessariamente uma perturbação específica de desenvolvimento da leitura, isto é, de dislexia. Aliás, apenas uma percentagem reduzida de crianças com dificuldades de aprendizagem de leitura tem dislexia. Assim, esperar para ver nunca será uma boa solução; nenhuma criança se torna um leitor com dificuldades aos 15 anos, salvo situações excecionais. Se, por um lado, existem sinais desde uma fase precoce que podem indiciar possíveis dificuldades de leitura (ver Despiste e intervenção precoce - Quadros 1 e 2), por outro lado existem atividades que o educador e o professor podem utilizar para um ensino mais eficaz desde a idade pré-escolar (ver Por uma intervenção precoce e aprendizagem da leitura ativa).
Finalmente, se o ensino e o treino sistemático, continuado, explícito, com envolvimento ativo e motivado da criança, não se revelarem eficazes, a avaliação de dificuldades de aprendizagem da leitura exige uma avaliação neuropsicológica rigorosa, feita por psicólogos com especialização em neuropsicologia. São estes os técnicos para os quais potenciais dificuldades devem ser orientadas. É, contudo, importante salientar que identificar e diagnosticar de nada serve se depois os meios de apoio e intervenção não estiverem disponíveis desde um momento precoce e com eficácia assegurada (ver Intervenção).
A investigação tem demonstrado que o uso de computadores ou de formas informatizadas de intervenção tem um impacto pequeno na magnitude de eficácia de um programa de intervenção de leitura (Cheung & Slavin, 2013). Contudo, existe alguma evidência do uso destas tecnologias em intervenções com crianças com dificuldades de leitura ser mais eficaz entre o 1.º e o 3.º ano, especialmente quando o programa é muito intenso com tempo superior a 1h15m por semana, realizado em conjunto com intervenções tradicionais, por exemplo, com professores e em pequenos grupos, e com ênfase em atividades de treino fonémico. O que determina a eficácia de um treino informatizado dirigido a crianças com dificuldades de leitura é a natureza do treino (em que competências incide), o papel do professor, e a natureza, qualidade, e intensidade da intervenção convencional com que é combinado.
O mais frequente é a ocorrência de dificuldades cumulativas na leitura e escrita. Esta situação é evidente em crianças com desenvolvimento típico ou com perturbação da aprendizagem específica. Por exemplo, na dislexia as dificuldades ocorrem nos processos leitores (e.g., precisão, fluência e compreensão da leitura) e ortográficos. Contudo, apesar de menos frequente, é possível as crianças apresentarem dificuldades apenas num dos domínios.
Apesar da interdependência entre os processos envolvidos na escrita (i.e., caligrafia; ortografia; e planeamento, textualização e revisão de textos) é possível a presença de dificuldades apenas num dos processos. Por exemplo, as crianças com dificuldades na caligrafia (e.g., disgrafia) poderão apenas manifestar alterações na legibilidade e rapidez de escrita, sem que estejam presentes dificuldades na leitura, na ortografia e no planeamento, textualização e revisão de textos.
A rapidez de escrita desenvolve-se gradualmente em função da experiência com a escrita. A recomendação mais comum passa por desenvolver o hábito de escrever frequentemente letras, palavras, frases e textos. Uma das estratégias mais utilizadas consiste em copiar rapidamente um conjunto de palavras ou frases durante um determinado período de tempo.