É fundamental preparar e mesmo garantir uma boa entrada na aprendizagem da leitura. Ao longo dos anos, ocorre um efeito “bola de neve” na gravidade das dificuldades de leitura, com consequências que vão, aliás, muito para além do plano cognitivo, afetando o nível emocional e comportamental, e com riscos de subsequente insucesso e desistência escolar prematura.
Não é demais enfatizar a importância de uma boa rampa de lançamento para a leitura: é fundamental preparar e mesmo garantir uma boa entrada nesta aprendizagem. Ao longo dos anos, ocorre um efeito “bola de neve” na gravidade das dificuldades de leitura: crianças com dificuldades no início da aprendizagem tendem a ter dificuldades cada vez maiores ao longo dos anos. As dificuldades exacerbam-se e extravasam para outros processos cognitivos além da leitura, com consequências que vão, aliás, muito para além do plano cognitivo, afetando o nível emocional e comportamental, e com riscos de subsequente insucesso e desistência escolar prematura. Sem nunca ter conseguido aprender para ler, dificilmente poderão ler para aprender.
Também para o Estado, a intervenção tardia, ao contrário da intervenção precoce, acarreta elevados custos, que implicam no imediato gastos elevados com ensino especial; a médio prazo, a retenção e repetição de ano destas crianças; a longo prazo, aumento da probabilidade de desistência escolar prematura e potencial condução a percursos desviantes em que a delinquência e a pobreza poderão estar presentes.
Torna-se claro que o despiste e intervenção precoces – ainda antes e durante o 1.º ano –, mesmo que pareçam ter à primeira vista um custo elevado, são mais do que justificados, e não têm o custo que terá o seu adiamento: quer economicamente com base na relação custo/eficácia, quer no seu papel na prevenção de potenciais efeitos nefastos na vida destas crianças e no seu futuro como cidadãos.
Autoria: Alexandra Reis, Luís Faísca e Tânia Fernandes Edição: Andreia Lobo
Publicação: 22.setembro.2020
A gravidade das consequências do não domínio da leitura e da escrita, bem como a percentagem significativa de maus leitores revelada por estudos como o PISA e o PIRLS, justificam que se utilizem instrumentos de avaliação adequados para o despiste de crianças em risco de eventuais dificuldades. Uma intervenção preventiva, anterior ao início do ensino formal da leitura, permite agir mesmo antes de as crianças sentirem dificuldades ou diferenças no seu percurso de aprendizagem em relação ao dos seus colegas.
A identificação mais tardia de défices de leitura, depois dos primeiros anos escolares, e estratégias de remediação que são, em larga medida, aulas tradicionais com atividades passivas, em grandes grupos, são ingredientes de uma receita para o fracasso.
Esta questão encerra em si vários fatores-chave implicados no desafio da aprendizagem da leitura, ou seja: “má leitura”; dificuldades de aprendizagem da leitura; dislexia; quando intervir; obter um diagnóstico. A leitura não é uma atividade espontânea, exige ensino explícito. A sua ligação com a linguagem oral não é intuitiva. Uma leitura de sucesso ou “boa leitura” implica uma leitura fluente com compreensão do significado daquilo que foi lido, e muitas competências estão envolvidas. A sua aprendizagem envolve esforço e ensino sistemático, continuado e explícito. Por isso, é natural que a aprendizagem da leitura seja um desafio para todas as crianças.
Dada a multiplicidade de influências (fatores extrínsecos e intrínsecos ao leitor), as dificuldades de aprendizagem da leitura não refletem necessariamente uma perturbação específica de desenvolvimento da leitura, isto é, de dislexia. Aliás, apenas uma percentagem reduzida de crianças com dificuldades de aprendizagem de leitura tem dislexia. Assim, esperar para ver nunca será uma boa solução; nenhuma criança se torna um leitor com dificuldades aos 15 anos, salvo situações excecionais. Se, por um lado, existem sinais desde uma fase precoce que podem indiciar possíveis dificuldades de leitura (ver Despiste e intervenção precoce - Quadros 1 e 2), por outro lado existem atividades que o educador e o professor podem utilizar para um ensino mais eficaz desde a idade pré-escolar (ver Por uma intervenção precoce e aprendizagem da leitura ativa).
Finalmente, se o ensino e o treino sistemático, continuado, explícito, com envolvimento ativo e motivado da criança, não se revelarem eficazes, a avaliação de dificuldades de aprendizagem da leitura exige uma avaliação neuropsicológica rigorosa, feita por psicólogos com especialização em neuropsicologia. São estes os técnicos para os quais potenciais dificuldades devem ser orientadas. É, contudo, importante salientar que identificar e diagnosticar de nada serve se depois os meios de apoio e intervenção não estiverem disponíveis desde um momento precoce e com eficácia assegurada (ver Intervenção).
Stanovich, K.E. (1986). Matthew effects in reading: Some consequences of individual differences in the acquisition of literacy. Reading Research Quarterly, 21, 360-407.
Cerca de um quarto dos estudantes portugueses têm dificuldades no domínio da leitura, percentagem que se mantém relativamente constante ao longo do ensino básico. Estas dificuldades parecem não estar exclusivamente relacionadas com a complexidade do código ortográfico do Português Europeu. Refletem o efeito de muitos outros fatores, entre os quais o meio socioeconómico e a qualidade da instrução.
Dada a multiplicidade de influências, é importante salientar que a presença de dificuldades de aprendizagem da leitura não reflete necessariamente uma perturbação específica de desenvolvimento da leitura, isto é, de dislexia. Uma instrução atenta tanto aos fatores extrínsecos, como aos processos cognitivos específicos de leitura e escrita e da sua aprendizagem, pode promover o sucesso num número substancial de estudantes. Num grande número de casos, é possível prevenir e remediar potenciais dificuldades.