Aprender a ler e a escrever pode começar muito antes da entrada na escola. A aprendizagem crucial está, no entanto, frequentemente reservada, e bem, para a escola. Existe, ainda assim, um conjunto de aprendizagens sobre o sistema de escrita que as crianças adquirem de modo informal e sem necessidade de escolarização. Elas preparam o caminho para a leitura e cultivam bons leitores, desde muito cedo.
1. Conhecimento do sistema de escrita
A escrita é uma invenção cultural destinada a representar graficamente a linguagem falada. Esta invenção não foi feita de uma só vez. Resulta de uma coleção de convenções que foram sendo inventadas e acordadas numa determinada comunidade linguística, frequentemente resultando do contacto e trocas entre comunidades distintas. À criança que aprende a ler e a escrever pede-se que conheça e domine esse conjunto de convenções, que são numerosas. Por exemplo: uma criança portuguesa aprende que o português se lê e escreve da esquerda para a direita, reconhece as formas das letras usadas em português, compreende que há uma forma ortograficamente correta de escrever as palavras, aprende a usar os acentos, aprende a fazer pontuação, quando usar letra maiúscula, etc.
Basta considerar este número elevado de convenções para apreciar o desafio colocado à criança e compreender que essa aprendizagem precisa de tempo. Precisa de escola. Felizmente, muitas crianças e os adultos letrados têm um papel ativo no desencadear e fomentar dessas aprendizagens. O papel ativo da criança é especialmente evidente quando constatamos que nos seus contactos com a escrita as crianças desenvolvem conceitos sobre ela, colocam hipóteses sobre a sua organização, procuram conhecer as suas formas e funções.
A construção desse conhecimento sobre a escrita não precisa de esperar pela escola. As crianças que chegam à escola e já reconhecem um livro, sabem orientá-lo e conhecem as letras, aprendem a ler e a escrever com maior facilidade e rapidez. Conceitos sobre a escrita são os conhecimentos que as crianças adquirem sobre as formas, as convenções e os usos da escrita.
2. A importância dos conceitos sobre a escrita para a aprendizagem da leitura e da escrita
Os conceitos sobre a escrita são um importante preditor da facilidade na aprendizagem da leitura e da escrita. Se antes da escolarização a criança viver num contexto em que os livros e a escrita têm usos frequentes e os adultos partilham esses objetos e usos com a criança num contexto afetivamente positivo, a criança aprende sem necessidade de ensino explícito um conjunto importante de conhecimentos sobre a linguagem escrita. O que são os livros? Como se organizam? O que são as letras? O que é ler? O que é uma palavra? São questões para as quais as crianças podem descobrir as respostas corretas muito antes de chegarem à escola. As crianças que chegam à escola já familiarizadas com os livros, a escrita e as letras partem à frente para aprenderem a ler e a escrever.
3. A ciência mostra
Muitos conceitos sobre a escrita podem ser aprendidos de modo informal, durante os anos pré-escolares, em situações de contacto com os materiais impressos e mediados por adultos leitores. Exemplo: leitura partilhada. Além da consciência fonológica, o conhecimento das letras e os conceitos sobre a escrita são bons preditores do sucesso na aprendizagem da leitura. O número de letras do alfabeto conhecidas pela criança é um bom preditor do sucesso na aprendizagem da leitura. Exercícios de escrita inventada promovem a consciência fonémica e o sucesso na aprendizagem da leitura e da escrita.
Autoria: Rui Alves Edição: Andreia Lobo
Publicação: 22.setembro.2020
Sim. Muitos pais já estão convencidos disso e tentam ler para os seus filhos. Contudo, para surtir efeitos positivos, essa leitura em voz alta precisa de obedecer a algumas condições: acontecer num contexto afetivo positivo em que os livros são valorizados e não são uma obrigação, nem para os pais, nem para as crianças. Lê-se por desejo, necessidade e gosto. Como sublinhou Daniel Pennac, o primeiro direito do leitor é não ler.
É naturalmente importante que os livros lidos sejam adequados aos interesses e capacidades das crianças ouvintes. É também importante que essas leituras partilhadas possam ser regulares. Tornar-se um hábito. Se estas condições estiverem reunidas, a criança vai aprender muitos conhecimentos novos sobre o mundo, as personagens das histórias e sobre a linguagem. A leitura por um adulto vai ainda despertar na criança o desejo que José Morais bem caracterizou nas páginas do seu A Arte de Ler: “Ouvir a leitura, em voz alta, pelos pais cria o desejo de ler por si mesmo, desejo tão irresistível como o de caminhar sozinho”.
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A aprendizagem da leitura/escrita implica a aprendizagem de um sistema de signos gráficos que representam a fala e o desenvolvimento de conhecimentos e habilidades que possibilitem a compreensão do que se lê e a capacidade de expressão através da escrita. Por isso, o sucesso nesta aprendizagem é influenciado pela condição em que cada criança se encontra quando inicia a escolaridade, em particular pelo seu desenvolvimento linguístico e pelo contacto prévio que teve com a escrita.
Desenvolver nas crianças em idade pré-escolar habilidades para lidar conscientemente com os constituintes fonológicos da fala ajuda-as a familiarizar-se com a ideia de que as palavras são compostas por “bocadinhos de sons”. Esta noção será útil mais tarde, quando tiverem de aprender que as letras servem para representar os segmentos mais pequenos da fala, os fonemas.